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Para diplomatas, Brasília é posto para relaxar e nem circuito de festas diminui

UOL

Um país importante, sem grandes conflitos externos e com uma capital relaxante. Para o olhar dos diplomatas locados em Brasília, a cidade reúne elogios por sua organização e tranqüilidade e também críticas pelo custo de vida, burocracia e isolamento.

E nem o circuito de festas nas embaixadas rompe o silêncio do setor onde estão as representações estrangeiras – só a dos EUA tem movimento, com a tradicional procissão atrás de um visto no passaporte.

Hoje são 117 embaixadores em Brasília. O último a apresentar suas credenciais foi o da Eslovênia, em uma comitiva de uma pessoa só, que atende em um hotel. O penúltimo, o do Nepal, já dispõe de um escritório em prédio vizinho no setor hoteleiro.

Entretanto, a maioria das chancelarias está no Lago Sul e Norte, em casas alugadas, afinal, construir uma sede permanente no setor de embaixadas em terreno doado pelo Brasil é um grande gasto a ser aprovado por cada governo.

As indicações de onde se localizam cada uma causam confusão. Por exemplo, a placa de rua apontando a direção da residência da Malásia fica ao lado de propaganda de frango assado. O sobrado em rua sem saída que pertencia ao Gabão hoje é do Benin.

O endereço da embaixada do Paquistão agora é a casa do diplomata vietnamita. Toco a campainha e atende uma garotinha de olhos puxados e sorriso aberto. Tranthiphuong Thao, 10 anos de idade e dois de Brasil, responde em português afiado. “Eu sou a única pessoa da família que aprendeu português”, “meu pai está no escritório, ele não pode atender”, “a gente vai embora em 2011” são algumas frases da menina.

Já a embaixada da Nicarágua não é onde as placas apontam. Lá é uma casa particular agora. O monte de areia na calçada denunciava o que a empregada doméstica confirmou. Ela reclama da quantidade de gente a bater ali e as cartas que tem que endereçar de volta aos Correios.

Melhor sorte ocorre na representação do Sri Lanka, que fica na mesma rua da Arábia Saudita. Após uma espera entre a decoração que incluía um altar budista, mapas e pôster anunciando “Ceylon tea, the world knows none better”, o embaixador Adam Jauffer Sadiq recebe a reportagem do UOL Notícias.

“Gosto do clima, nem tão quente nem tão chuvoso. Comparado com meu último posto, a Arábia Saudita, é um paraíso”, sentencia Sadiq. “É muito tranqüilo, chega a ser relaxante. Dá para aproveitar mais o dia. Não tem muita gente nas ruas, bem diferente do meu país, que é muito úmido”, completa.

Em inglês, ele conversa sobre os também 50 anos da relação diplomática entre Brasil e Sri Lanka e discorre sobre as muitas palavras do cingalês vêm do português (Portugal colonizou por 150 anos a ilha ao sul da Índia). Cita “lenço”, “camisa”, “janela” e “mesa”. Se o vocabulário de Sadiq ficou facilitado pela colonização, ele ainda enfrenta com dificuldade do obstáculo dos verbos lusitanos.

Menos elogioso é um diplomata latino-americano que, em troca de não ser identificado, prometeu ser sincero e bem pouco diplomático: “A cidade é caríssima e há muita burocracia. É complicado pedir uma linha telefônica ou um registro. A energia elétrica cai duas vezes por dia, não tem linhas aéreas com as capitais, tem de passar por SP ou Rio.” Buenos Aires ou Santiago são postos mais desejados que Brasília, apesar da maior importância geopolítica do Brasil. “O clima é bom, e quase não há congestionamento, mas também não tem charme.”

O Itamarati calcula que até o final do ano 126 países tenham representação em Brasília, o que representaria um crescimento de 31% em relação a 2003, quando Lula assumiu a presidência, com uma tendência de países africanos e asiáticos aportarem no Brasil.

O contato maior dos diplomatas é com seus similares dos países fronteiriços e com os funcionários do Itamarati responsáveis por sua área, sejam subsecretários ou chefes de departamentos continentais. O circuito de festas inclui festividades patrióticas, coquetéis de chegada ou despedida dos funcionários e até happy hours – o Reino Unido, por exemplo, promove uma mensal. O motivo para os encontros são variados: reduzir a solidão, fazer contatos e se divertir.

Um desafio para os brasileiros é a pontualidade, afinal, essas celebrações têm horários para começar e terminar e comes e bebes ilimitados, afinal, tudo é pago com dinheiro público de cada país.

Esse cenário atual contrasta com a pouca vontade das embaixadas para se mudarem a Brasília após a inauguração da cidade. Os diplomatas não queriam trocar o conforto e glamour do Rio da época pelo poeirento Planalto Central. Curiosamente, um incentivo inusitado veio durante a ditadura militar, quando guerrilhas oposicionistas começam a sequestrar embaixadores estrangeiros no Rio para conseguir liberação de presos políticos: Brasília passou a ser uma boa opção, vigiada, segura e isolada.
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