Olhar Direto

Sexta-feira, 26 de abril de 2024

Opinião

Ex-celentíssimo Juiz - Solilóquio sobre a sociedade e o magistrado

Desde que me reconheço como indivíduo, convivo com magistrados. Desde a infância frequentei festas em que juízes ou desembargadores eram seus anfitriões e onde diversos de seus colegas eram habituais convidados. Desde os mais jovens anos aprendi a reconhecer a autoridade. Não somente empregando-lhes o tratamento adequado como nutrindo internamente a reverência pela posição que essas pessoas se dignaram a ocupar.
  
Sou filho de um magistrado. Quem sempre tive como exemplo em minha vida. E foi o primeiro magistrado que eu passei admirar.
  
Naqueles idos, o magistrado era a figura social das mais relevantes. Recebia um tratamento distinto. Era farto o cerimonialismo de tratamento que lhes eram despendidos. Existia na sociedade essa mesma reverência em relação aos magistrados. As cartas eram endereçadas assim:
  
Excelentíssimo Senhor Doutor
Fulano de Tal
Digníssimo Juiz de Direito da Comarca de...
  
Pouco a pouco o status de ser magistrado foi se mitigando. E diminuiu muito. Não desapareceu, por óbvio. Ainda se constata muito respeito social a essas autoridades. Mas não se pode negar que houve redução significativa.
  
Legalmente, não houve redução dos poderes de um magistrado. Neste plano, ocorreu apenas o surgimento do controle externo do Judiciário e a predição de regras e rotinas administrativas das varas. Só.
  
Essa mitigação de poder tem vindo da sociedade como um todo. Vê-se advogados – muitos deles mais jovens – sendo insolentes com magistrados, promotores, e até com colegas. Constato a perda do valor da autoridade que aprendi e sempre a julguei saudável.
  
Vez ou outra se noticia gestores públicos que – simplesmente – não cumprem decisões judiciais. Os meios coercitivos são baldos para se compelir o cumprimento. Não raras vezes, as entidades associativas são compelidas a atuar diante do desrespeito às prerrogativas dos magistrados perpetradas por outras autoridades estatais.
  
O ‘cartaz’ acima, que se tornou uma espécie de viral do whatsapp, foi aposto em uma sala de audiências na Comarca de Taguatinga-DF, e é – dentre muitas – uma tentativa de resgate. É claro que é pedante! Não cabe à autoridade pedir reverência, senão um mínimo de respeito aceitável, do tipo “não atender telefone na sala de audiências”, desde que ela mesma não o faça. Este acato deveria vir da sociedade.
  
Sou contundentemente a favor do respeito que deve existir por qualquer autoridade. Quando estou no aguardo do início de uma audiência, ou de um julgamento colegiado, ao adentrarem as autoridades o recinto, empertigo-me para saudá-las. Valho-me sempre do pronome de tratamento a elas pertinente. Aprendi assim. Fui criado em uma geração que possuía esse acato.
  
Esse respeito não visa somente à satisfação do ego daquele que julga (ou outra autoridade qualquer). Essa deferência deve se ter em relação àqueles que ocupam as posições cujo sentido teleológico é tomar decisões nodais para a sociedade. A deferência à autoridade se traduz numa manifestação afirmativa de obediência aos comandos que dela possam emanar. No caso do juiz, antes mesmo de ele se pronunciar sobre determinada questão, os jurisdicionados e os auxiliares da justiça estão a antedizer que o seu veredito será acolhido.
  
Esse respeito à autoridade é imprescindível ao estado democrático de direitos. A quem poderia interessar a perda de valor das instituições do Estado?
  
Uma democracia forte está sustentada justamente no respeito a essas instituições e suas autoridades, que devem estar fortalecidas para atuar livremente. E o estado de direitos só é atingido em todas as suas faculdades quando há efetivo cumprimento das normas: abstratamente quanto à lei, e concretamente quanto às decisões judiciais. Precisamos resgatar – em nossa educação – o respeito pela autoridade.
 
Paulo Helene Lessa, 40, é advogado em Cuiabá e mestre em Direito Civil pela PUC/SP
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