Olhar Direto

Sexta-feira, 26 de abril de 2024

Opinião

Breve reflexão sobre a liberdade

Quero iniciar este texto com uma pergunta ao nosso inteligente leitor: para você “liberdade” é um direito porque foi outorgado pelo Estado (está na Carta Magna Art. 5º) ou “liberdade” é um direito decorrente da nossa qualidade de ser humano, portanto, “natural”?   
  
Liberdade é um tema filosófico da mais alta relevância. Grandes pensadores da história discorreram sobre esta qualidade da nossa espécie. Citamos Descartes, Kant,  Sartre, Marx e outros. Para Descartes (1.596/1.650) a liberdade é decidida pelo indivíduo, portanto é uma questão de escolha, assim nas suas palavras "para que eu seja livre, não é necessário que eu seja indiferente na escolha de um ou outro dos dois contrários; mas, antes, quanto mais eu tender para um, seja porque eu conheça evidentemente que o bem e o verdadeiro aí se encontram, seja porque Deus disponha assim o interior do meu pensamento, tanto mais livremente o escolherei e o abraçarei”.
 
Kant (1.724/1.804) relaciona liberdade com autonomia, ou seja, o indivíduo “constrói” suas próprias regras com o uso da razão pura e as segue pelo dever. Kant defende a liberdade como resultado do livre arbítrio e não pela obediência às leis. Em Sartre (1.905/1.980), o homem está “condenado” a ser livre e a fazer escolhas. Essa é a sua condição de vida como ser humano. Ele é livre para fazer o que tiver vontade.
 
Karl Marx (1.818/1883) relaciona a liberdade com bens materiais no contexto de uma sociedade capitalista. Para ele “a liberdade posta pela sociedade capitalista é uma falsa liberdade, pois é uma liberdade formal e abstrata”. Marx não chegou a viver a sociedade que ele planejou em teoria. As experiências socialistas registradas pelo historiografia proporcionaram aos seus habitantes qualquer coisa, menos “liberdade” em qualquer sentido que se queira abstrair.
  
Os autores citados desenvolveram seus pensamentos acerca da liberdade com incrível profundidade e, obviamente é impossível transmitir esse conhecimento em um texto curto. Todavia, nosso objetivo é (sem compromisso com a cientificidade) argumentar no sentido de que a liberdade nasce conjuntamente à minha condição de ser de uma espécie auto-consciente e gregária (homo-sapiens). Independe de uma Estado, através da sua burocracia formadora de leis, positivá-la. Na verdade, inscrevêmos determinados direitos naturais em constituições escritas (liberdade, vida, propriedade) dado ao péssima uso que fizemos com a liberdade ao longo da nossa existência como civilização. Uma delas foi a escravização de outros humanos e a implantação de estados totalitários. Também consignamos que a liberdade não é absoluta. Com efeito, seu limite será a existência do outro.
 
Nesse contexto, se você acredita que a liberdade é inerente à nossa condição de ser humano, deve ficar muito atento aos discursos ideológicos. Existem determinadas formas de organização social em que a liberdade inexiste por definição. Ela é absorvida pelo Estado e em nome deste. Aqueles que defendem este modelo de sociedade, opõe-se ao arranjo de economia de mercado - laissez-faire (deixar fazer) criticando-no como formador de duas classes antagônicas: burguesia e proletariado (Marx). Aquela “exploradora” desta. Malgrado a teoria econômica de Marx ter se assentado em premissas erradas (teoria do valor objetivo por exemplo) e todas as tentativas implementadas de economias planificadas terem sido um desastre econômico e humanitário, suas ideias ainda são muito defendidas por “intelectuais” de esquerda em nossos dias.
 
Outro aspecto importante da liberdade e demais direitos naturais (vida e propriedade) mas negligenciado pelo discurso socialista está no fato de que tais direitos geram para os outros deveres com prestação “negativa”. O meu direito à liberdade faz nascer o seu dever de “não retirá-la”; ao meu direito à propriedade, o seu dever de “não subtraí-la”; e o meu direito à vida, o seu dever de “não matar-me”. Assim, diferentemente dos “direitos naturais” os chamados “direitos sociais” (saúde, educação, trabalho, lazer,segurança etc) geram obrigações positivas aos demais. Se eu tenho direito à saúde, o dever de alguém será positivo (terá que pagar por isso) e assim sucessivamente.
 
Recorrendo à lógica Aristotélica, podemos fazer a seguinte inferência. A “liberdade” é um direito decorrente da nossa qualidade de ser humano. Consequentemente, fazemos escolhas cognitivas que se transformam em ações individuais exteriorizadas no mundo dos fenômenos e que perturbam a existência do outro (condição sine qua non para atribuição da responsabilidade moral inclusive). Invariavelmente, a ação humana vai redundar em desigualdade material, uma vez que somos dotados de potencialidades diferenciadas. É assim que na economia de mercado, aqueles que exercitam com maior eficiência e eficácia os dons empreendedores (satisfazendo necessidades dos consumidores em um sistema de trocas voluntárias) acumulam capital. Contudo, não possuem segurança, uma vez que as forças de concorrência atuam de forma a exigir deste capitalista mais eficiência ou inovação para manter-se no mercado.
 
Esta questão é a “pedra de toque” no pensamento da esquerda, que, por definição, defente a igualdade material (impossível em um ambiente de livre mercado por definição). Esse arranjo nutre na mente dos socialistas o estigma do anti-capitalismo. Decorre então que restará a esta ideologia apenas duas alternativas: defender a expropriação da propriedade privada adquirida pelo uso da liberdade e coletivizar os meios de produção (socialismo marxista) ou, fazer a propalada “redistribuição da riqueza” (social-democracia) via tributação e/ou expropriação amparada no conceito de função social da propriedade. Atualmente no Brasil você trabalha cinco meses apenas para pagar os tributos recolhidos pelo Estado, os quais, em tese, retornarão em serviços públicos aos indivíduos (direitos sociais).
 
Atente para o fato de que, em toda discussão política ideológica, em maior ou menor grau, estará presente a questão da liberdade. Não apenas em termos econômicos, mas também em relação àquilo que o indivíduo pode ou nao pode fazer com sua vida (eutanásia, aborto, drogas, jogos etc). Não tenha dúvidas quanto a isso. Só existem juízos éticos porque desenvolvemos o conceito de liberdade. Setores à direita do espectro político (extrema direita) também flertam com a mitigação da liberdade em nome de uma sociedade hierarquizada e com forte intervenção do estado. Devemos estar alertas, pois, como disse Thomas Jefferson (1.743/1.826) terceiro Presidente dos EUA e o principal autor da declaração da independência daquele país, “o preço da liberdade é a eterna vigilância”. Vigie-mo-lá!
 
 
Julio Cezar Rodrigues é economista e advogado (rodriguesadv193@gmail.com)
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