Olhar Direto

Sábado, 20 de julho de 2024

Opinião

A responsabilidade solidária dos reclamados da mesma família no trabalho doméstico

Autor: Carla Reita Faria Leal e Waleska M. Piovan Martinazzo

19 Jul 2024 - 08:00

Para tratarmos da modalidade da responsabilidade daqueles que usufruem da mão de obra do trabalhador doméstico, comentaremos recente decisão da 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, de São Paulo, que manteve sentença condenatória de uma mãe e um filho, de forma solidária, pelas verbas devidas a empregado doméstico. Para o colegiado da corte trabalhista paulista, a prestação de serviços contínua, ainda que em casas diferentes, era para integrantes da mesma unidade familiar, levando ao reconhecimento da responsabilidade solidária das pessoas beneficiadas pelo trabalho doméstico prestado.
Vale esclarecer que a responsabilidade solidária ocorre quando há vários agentes e sobre eles incorre a obrigação sobre o débito todo, como se cada um fosse um único devedor, podendo ser demandado apenas um, alguns ou todos os devedores solidários. Importante destacar também que a solidariedade decorre de previsão em contrato ou em lei.
            Assim, no caso em questão, o reclamante trouxe ao processo que foi contratado para trabalhar na casa de uma mulher (a mãe) durante a semana, porém passou atuar na casa do filho dela aos finais de semana. Ademais, acrescentou que também trabalhava alguns dias na empresa da família.
Na peça contestatória, a reclamada alegou que aos finais de semana o trabalhador doméstico exercia a função de diarista para terceiros, dentre eles estaria o seu filho. Sustentou que “não poderia ser responsável pelas atividades exercidas pelo reclamante em seus dias de folga, não podendo lhe serem imputadas obrigações em decorrência da prestação de serviços realizada a terceiros”.
            O reclamado (o filho), por sua vez, alegou que os serviços prestados eram esporádicos, a cada 15 ou 20 dias, portanto, não existiria vínculo empregatício entre ele e o trabalhador. Entretanto, a prova testemunhal mostrou que trabalhador doméstico trabalhava simultaneamente para a mãe e o filho, integrantes do mesmo núcleo familiar, prestando serviços em ambas as residências, ora na mesma jornada de trabalho, ora nas folgas. Além disso, os cartões-ponto referentes às anotações da primeira reclamada continham informações sobre dias em que houve labor na casa de seu filho, também reclamado.
            Desta forma, tanto a decisão de primeiro grau quanto a do Tribunal mencionaram a Lei Complementar n.º 150/2015 – a lei dos empregados domésticos – que conceitua o empregado doméstico como “aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de dois dias por semana”.
            Tendo como fundamento esse artigo, a jurisprudência trabalhista tem reconhecido que os membros de uma unidade familiar que se beneficiam do trabalho doméstico alheio são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes dessa relação.
            Nestes casos, o contrato de trabalho doméstico é classificado como atípico, haja vista que o trabalhador estabelece vínculo com todos os beneficiados de seu trabalho e que ali residam e não apenas com aquele que formalizou documentos, por exemplo: em relação a um casal que contrata doméstico, mesmo que o esposa figure como empregadora no contrato de trabalho firmado com o empregado, o seu esposo pode figurar no polo passivo da demanda e responderá da mesma forma por eventuais débitos trabalhistas.
O interessante no caso decisão do TRT da 2ª Região é que, mesmo residindo os familiares em diferentes residências, se reconheceu a responsabilidade solidária dos membros do grupo familiar, justamente porque ambos, nas duas residências, se beneficiavam indistintamente do trabalho desenvolvido pelo empregado doméstico reclamante.
Por fim, ainda destaca-se que os familiares que usufruíram do trabalho do empregado doméstico podem ser incluídos na polaridade passiva desde o início da ação, ou serem incluídos posteriormente, na execução, se aquele que foi apontado como réu da ação em seu começo não tiver patrimônio para responder à condenação.
 
Carla Reita Faria Leal e Waleska M. Piovan Martinazzo são integrantes do Grupo de Pesquisa sobre o meio ambiente do trabalho da UFMT, o GPMAT. 
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