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Sexta-feira, 26 de abril de 2024

Opinião

O casal a espera do filho que não vem - Parte 2

Existem dois tipos de crise pela qual passamos durante nosso ciclo de vida, as previsíveis, e as, não previsíveis.

As crises previsíveis, que também podem ser chamadas de crises de desenvolvimento, são aquelas no qual todos nós passamos.

As crises não previsíveis são aquelas que algumas pessoas passam e outras não, são as acidentais.

A impossibilidade de se ter um filho geneticamente, é uma crise acidental, não previsível, que leva os seres humanos a se darem conta de que não tem e nunca terão pleno controle de suas vidas. São os acasos da vida, as causalidades, os azares.

Diante das crises, dos obstáculos, das adversidades, e situações difíceis, cada pessoa reage de uma forma. Existem pessoas que respondem as dificuldades, através de queixas e vitimização, enquanto outras se concentram no futuro com otimismo. O que diferencia essas pessoas é uma competência psicológica chamada resiliência.

Resiliência é um conceito que se origina da física, e refere-se à capacidade de um material absorver energia sem sofrer alterações. A psicologia define como a capacidade do indivíduo de lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas e, ou capacidade de voltar ao mesmo lugar em que estava depois de enfrentar uma situação de trauma ou de impacto, ou ainda, é o potencial do ser humano de sair fortalecido de uma experiência aniquiladora.

Para sermos mais específicos, para o casal, a resiliência é a capacidade que ambos possuem de enfrentar as adversidades com flexibilidade e dinamismo. É uma qualidade do casal e não da pessoa individualmente. E essa capacidade de enfrentarem juntos, as situações impostas pela vida, é à base dos relacionamentos duradouros, mantendo seu amor e companheirismo.

A infertilidade pode afetar a satisfação conjugal e o ajustamento familiar. Então, diante da triste realidade de não conseguir geneticamente ter um filho, o casal precisa adaptar e readaptar, organizar e reorganizar, negociar e renegociar seu projeto de vida.

A infertilidade envolve uma reorganização tanto no nível individual como conjugal, e ela é diferentemente internalizada pelo casal. Desta forma é preciso que ambos tenham compreensão, amor, paciência, persistência e esperança, para que se possa conseguir superar essa crise.

É necessário que o casal consiga nomear o desejo de um filho, encontrar seus limites e colocar um ponto final, procurando outra forma de realizar o desejo de serem pais.

A infertilidade deve ser encarada e resolvida, pois o problema não é ela em si, mas o que se faz dela.

O casal necessita tirar o foco da infertilidade e se concentrar no verdadeiro significado do conceito de família.

A parentalidade esta ligada, do ponto de vista biológico, a capacidade de reproduzir, porém esta não é a condição primordial, para se tornarem pais de crianças que não possuem seu material genético. Assim, percebemos que, mais do que amar seus próprios filhos, é ter o poder de amar os filhos de outras pessoas como se fossem seus.

A terapia sistêmica familiar considera que tantos os comportamentos de cada indivíduo quanto os padrões relacionais de cada subsistema influenciam e são influenciados pelos demais. Ela tende a compreende os problemas em termos de sistemas de interação entre os membros de uma família. Desta forma, a infertilidade precisa ser abordada dentro da conjugalidade, pois ela é uma crise conjugal e não individual. É importante considerar as dinâmicas envolvidas durante o processo do casamento, os acordos implícitos e os explícitos que influenciam diretamente na forma como cada cônjuge vai elaborar essa questão.

A infertilidade do casal, dificilmente é discutida com a família e amigos, principalmente porque sentem vergonha, ou porque não recebem o apoio de que necessitam, então procuram esconder e manter em segredo. A manutenção desse segredo pode estar totalmente ligada à dificuldade do casal de entrar em contato com o diagnóstico de infertilidade e a dor causada pela situação. Nem sempre a manutenção desse segredo é de forma consensual pelo casal.

É de extrema importância um tratamento abrangente e eficaz para ajudar esses casais inférteis a lidar com essa crise e seus sintomas. Um espaço onde possam falar de seus desejos, medos e dores, significativos em sua história.

Muitos casais ficam com suas vidas em suspenso, esperando o filho que não vem, adiando planos e decisões.

Como acontece em outras crises de vida, a infertilidade pode promover a união entre o casal, reforçar o apoio emocional, o sentimento de compromisso e lealdade, bem como, aumentar a confiança mútua e intimidade. Pode ainda promover o crescimento pessoal e fortalecer a relação conjugal.

Desta forma a terapia familiar busca desenvolver no indivíduo e no casal, o ajustamento ao seu destino como casal biologicamente sem filhos e continuar a construir uma vida satisfatória e significativa, podendo ou não incluir a paternidade.


Andréia Ramos é Psicóloga Clínica, Especialista em Psicologia Sistêmica.
andreiaramospsico@gmail.com 
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