Olhar Direto

Sábado, 04 de maio de 2024

Opinião

Prazos dilatados na Lei de Licitações – Parte I

Muitas expectativas foram criadas em torno da famigerada nova Lei de Licitações e Contratos – Lei nº 14.133/2021, mormente se seria capaz de diminuir a burocracia e aumentar a prevenção contra os atos de corrupção que, nem de longe, foram superados pelo discurso moralizante da sua antecessora, a Lei nº 8.666/1993. 

Como toda boa regra comporta exceções, aqui não poderia ser diferente. Não bastasse a benesse do período de transição fixado incialmente em dois anos para os entes federativos se adaptarem às novas regras (art. 193), o legislador também previu situações nas quais o prazo de implantação da nova lei foi dilatado para seis anos (art. 176, I, II e III). 

Muita calma nessa hora, antes de sair por aí gritando aos quatro cantos do mundo que vai aplicar a nova lei só a partir de 2027, é preciso entender bem quais são essas situações e interpretá-las com cautela para não cair em armadilha e ser alvo de responsabilização pelos órgãos controladores. 

Já ouviu aquele velho ditado: "você não é todo mundo?" Pois bem, essa é uma prerrogativa que não alcança a todos, mas apenas os municípios que possuem população inferior a 20 mil habitantes. 

Além disso, restringe-se a três hipóteses específicas, sendo a primeira relativa aos requisitos que devem ser observados pela autoridade máxima para designação dos agentes responsáveis pela condução da licitação, que será abordada nesse artigo. 

Já as outras duas hipóteses estão relacionadas à obrigatoriedade de realização de licitação sob a forma eletrônica e à implantação do Portal Nacional de Compras Públicas, que serão temas de artigos futuros. 

Para definirmos os contornos dessas exceções temporais, é de fundamental importância termos em mente qual a finalidade pretendida pela lei e interpretá-las de forma sistêmica com outros dispositivos legais. 

É perceptível que o legislador, ao inserir a gestão por competências no art. 7º da lei, reservou atenção especial para os atributos dos agentes públicos envolvidos no processo de contratação, os quais, por força de expressa previsão legal, deverão ter conhecimento técnico adequado e ser preferencialmente servidores efetivos dos quadros permanentes da Administração Pública com formação compatível com o desempenho das funções.
 
Além disso, a lei impôs regras que vedam a atuação do agente em conflito de interesses e exige a observância do princípio da segregação de funções, com a finalidade de conferir maior impessoalidade, eficiência e aprimorar a capacitação dos agentes públicos. 

Nesse sentido, não me parece razoável, por exemplo, dispensar a observância do princípio da segregação de funções, sem um estudo adequado da realidade local, uma vez que, além de ser um princípio previsto também no art. 5º da mesma lei, é um tema consagrado com uma visão bastante restritiva na jurisprudência dos Tribunais de Contas. 

Do mesmo modo, não faz sentido dispensar os pequenos municípios pelo exagerado período de 6 anos da obrigação de dispor de gente qualificada e, ao mesmo tempo, exigir deles o imediato cumprimento de todas as demais obrigações e procedimentos novos contidos na lei. 

O fato é que a concessão de prazo alargado para o cumprimento destes requisitos não significa uma carta branca para a autoridade superior das pequenas municipalidades para escolher às cegas os subordinados para o desempenho de atividades relacionadas às licitações e contratos. 

Os desafios são muitos, mas o que não dá é para ficar esperando o transcurso de tão alongado prazo para só então começar a adotar as medidas necessárias no tocante à melhor estruturação do quadro de pessoal e capacitação dos agentes públicos. O tempo urge. Mãos à obra! 
 

Paula Tavares é advogada, mestre em Administração Pública e assessora jurídica do Tribunal de Contas de Mato Grosso 
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