Olhar Direto

Segunda-feira, 06 de maio de 2024

Opinião

A loucura em Florbela Espanca.

“Sinto o passo da dor, essa cadência. Que já é tortura infinda, que é demência! Que é já vontade doida de gritar!” (ESPANCA, 1919,p.36)

Considerada uma das primeiras feministas portuguesas, Florbela d'Alma da Conceição, filha do senhor João Maria Espanca com autorização de sua esposa Mariana do Carmo Inglesa Toscano que estéril permitiu que seu esposo tivesse filhos com Antónia da Conceição Lobo e os criou como afilhados. Em seus 36 anos de vida, consagrou-se como poetisa, professora e jornalista, escrevendo para jornais e revistas. Pioneira na vida acadêmica de Portugal sendo a primeira mulher a ingressar na faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, logo após terminar seus estudos em Letras.

Usou a alcunha de Florbela Espanca, e foi assim que desafiou a sociedade portuguesa conservadora do início do século XX, casando-se três vezes. Seus infortúnios emocionais:  um aborto espontâneo, a morte precoce do irmão Apeles, os relacionamentos amorosos, espelharam-se em suas letras de sonetos e poemas. Motivaram também Espanca a tentar o suicídio por duas vezes, conseguindo efetivar a ação no dia de seu aniversário de 36 anos, em 8 de dezembro de 1930. Deixara um legado, além dos poemas, contos e sonetos, um diário e epístolas, em suas linhas demonstrava a instabilidade emocional em que vivia, o teor de confissões, de dores, amores e solidão, além de uma busca incansável pela felicidade.

“Eu sou a que no mundo anda perdida, Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte. Sou a crucificada...a dolorida...“(ESPANCA, 1919,p.11)

Publicada em várias línguas, sua vida e obra é discutida e analisada por vários autores. No Brasil, um de seus poemas tomou voz pelo cantor Fagner, na música “Fanatismo”

Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida.
Meus olhos andam cegos de te ver. 
Não és sequer razão do meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida!

A loucura em Florbela Espanca é sinalizada pela dor sentida e ressentida. Sentida pelas perdas físicas e emocionais, ressentidas pela sociedade portuguesa convencional e tradicional que ordenava os corpos femininos e apontava os comportamentos transgressores a época, pressionando-as a seguirem regras e condutas ligadas ao conservadorismo religioso cristão. Florbela não seguiu essas amarras, mas elas insistiram em moldá-la, a pressão totalitária da sociedade em que vivia, feriu sua alma, levando-a ao suicídio.

REFERÊNCIA

ESPANCA, Florbela. Sonetos Completos. Coimbra: Gonçalves, 1934.
 
Lidiane Álvares Mendes é doutoranda em Estudos de Cultura Contemporânea/ UFMT. Bolsista CAPES. Autora do livro: Na esteira da loucura: Colônia de Alienados Eduardo Ribeiro – Manaus/AM
xLuck.bet - Emoção é o nosso jogo!
Sitevip Internet