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Fenômeno no Youtube, professor Clóvis de Barros avalia colegas Karnal, Cortella e Pondé; veja entrevista

Visto por mais de 1,3 milhão de pessoas, o palestrante esteve em Cuiabá no último dia 29 e concedeu entrevista ao Olhar Conceito.

04 Dez 2016 - 09:39

Da Reportagem Local - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Rogério Florentino Pereira/OD

Clóvis de Barros Filho

Clóvis de Barros Filho

Professor, escritor, palestrante e filósofo, Clóvis de Barros Filho tem se tornado um fenômeno como formador de opinião. Com abordagem quase sempre irônica, seus livros mesclam ética, existência, felicidade, filosofia grega, Jesus e Nietzsche. Clóvis forma com Leandro Karnal, Mario Sérgio Cortella e Luiz Felipe Pondé uma nova “classe”: a dos intelectuais pop-star. Professor aposentado da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), suas palestras e entrevistas já atingiram a marca de 1,3 milhão de acessos no Youtube.

Nosso entrevistado, todavia, discorda de tudo o que disse acima: não se considera estrela pop, renega o título de filósofo, se põe aquém de seus pares e admite: “não ensino ninguém a viver, até porque se soubesse como, seria feliz”.

Clóvis de Barros Filho, entre um voo e outro, pousou em Cuiabá no dia 29 de novembro e foi aplaudido por 1.250 pessoas no Hotel Fazenda Mato Grosso, em palestra “A vida que vale a pena ser vivida”, promovida pela “Sem Mais Desculpas Treinamentos”. Horas antes, concedeu entrevista exclusiva ao Olhar Conceito.

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Embora nossa entrevista tivesse sido combinada há 01 mês, existe sempre a possibilidade dela não ocorrer. Chegamos ao Hotel para o encontro, aonde vimos uma grande equipe preparando o auditório. Abordamos e recebemos a informação de que Clóvis estava descansando em seu quarto e não nos atenderia. A proteção oferecida ao palestrante nos fazia crer que entrevistaríamos uma estrela do rock. Frustrados, insistimos com o promotor do evento, Aly Baddauhy Junior, que topou incomodá-lo para propor o impertinente diálogo.

A entrevista ocorreria em seu quarto. Clóvis aceita o convite. Aguardamos por alguns segundos. A porta se abre e topamos um entrevistado cansado, trajando amassada camiseta branca, sem qualquer sinal de ânimo para entrevista. A figura, a princípio, me foi entristecedora, mas as palavras, posteriormente, me reacenderiam o ânimo. Eu, felizmente, estava enganado.

“Entre, Aly, não fique aí fora neste calor escaldante!”, disse rindo nosso entrevistado. “Vamos, sentem-se, fiquem à vontade!”. Antes, lembrou-se de desligar a TV, mas não de acender as luzes. Conversamos no escuro, fitando a sombra do interlocutor, que se sentava à beira da cama e olhava sempre para baixo. Passei às perguntas:

Clóvis, você já esteve em Cuiabá outras vezes, mas sempre na mesma ocasião: palestra. Correto?

“Sim, já estive em Cuiabá mais de 10 vezes, sempre a trabalho e, portanto, infelizmente conheço pouco da cidade. A gente vem, dá a palestra e acaba indo embora. A primeira vez que vim foi à convite da Associação dos Criadores de Carne Suína do Estado do Mato Grosso, uma palestra na Secretaria da Agricultura. Já estive várias vezes no Centro de Eventos do Pantanal, já fiz palestras para a SEBRAE. Já estive no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, etc”.

Conte um pouco sobre o conteúdo das suas mais recentes palestras:

“A tentativa que eu tenho é a de permitir às pessoas se perguntarem: será que aquilo que eu persigo com tanto afinco merece tanta atenção e valem tanto quanto acho que valem? Meu objetivo é que as pessoas consigam fazer essa pergunta, não que eu tenha a resposta. Eu nunca tenho a resposta, apenas motivo a fazer a pergunta.

Suponhamos que alguém trabalhe muito para conseguir comprar um carro com um buraco no teto. Minha proposta é fazer com que essa pessoa se pergunte se um carro com buraco no teto é tão importante quanto ela acha que é. Claro que isso está muito ligado à ideia de felicidade. O que tem que acontecer para que a vida seja feliz? Evidentemente que cada um sabe de si. Por exemplo, não sei se eu me dedicaria tanto para comprar um carro com buraco no teto. Talvez eu preferisse um carro com outras características ou talvez, carro nenhum.

Haverá quem ache que para a vida ser boa é preciso fazer uma visita aos Estados Unidos e então todos os esforços são feitos neste sentido. É uma maneira de entender. Haverá quem ache que é preciso ter uma reserva patrimonial imobiliário, então a pessoa junta dinheiro, compra uma casinha aqui, um apartamento ali, etc. Ora, há um milhão de motivos para você se empenhar. Minha pergunta é: será que essas coisas são, de fato, tão importantes? Pessoalmente, acho que não, mas jamais tento convencer as pessoas do que penso, pois sequer digo o que penso, mas dou a palavra aos sábios, e eu, como não sou sábio, fico quieto.

O que faço é explicar o que os grandes sábios disseram para essa mesma pergunta e eles disseram coisas incríveis. Os gregos, por exemplo, acreditavam que você deveria buscar a perfeição de você mesmo. Então se você tem talento para desenho, a felicidade é ser o melhor desenhista possível, o melhor nadador possível, o melhor jogador de bola ou professor, possível. Eles diziam que quando você buscava essa perfeição a vida ficava desafiadora e exigia de você uma determinação para fazer cada vez melhor, como se tivesse que dar a palestra de hoje melhor que a de hoje de manhã ou de ontem, ou de sempre.

Você tinha que buscar a perfeição de você mesmo, pois você faz parte do universo e você, de certa forma, cumpre um papel no universo. Então, quanto melhor você fizer aquilo que faz, melhor o universo funciona, por isso é importante buscar a perfeição, não por você, mas pelo todo.

Você tem Jesus, por exemplo, que dirá que o grande barato da vida é melhorar a vida dos outros. Pessoalmente, acho essa ideia incrível. Acho mesmo que só escolhe ser professor quem concorda muito com isso. Afinal de contas, não há nenhuma justificativa para escolher essa profissão se não for para melhorar a vida dos outros. Mas o jornalista também, o médico, o psicólogo, etc. E falo do trabalho, onde você recebe salário. O que dirá das relações familiares.

Existe a ideia de que quando você consegue amar as pessoas, você vive bem. Só par te resumir: à medida que eu vou dando a resposta dos sábios, as pessoas vão se acanhando de pensar o que sempre pensaram. Vão vendo o quanto é idiota você viver para comprar um carro com um buraco no teto.

Ou não, ou então pensarão: ‘estes sábios são imbecis. A felicidade não tem nada ver, nem com a excelência, nem com o amor, mas tem a ver com ter uma piscina dentro de casa. Ótimo, pois se você submeter suas convicções a essas teorias e você continuar convencido de que você quem tinha razão, muito melhor. Sinal que sua felicidade tem mesmo a ver com isso e pau na máquina, show de bola.

De maneira que eu não vim aqui ensinar alguém a viver, até porque se eu soubesse eu seria feliz. Eu vim para ajudar as pessoas a refletir sobre a própria vida e ver se elas não conseguem dar para elas propostas mais nobres”.

Clóvis é professor, palestrante, escritor e filósofo. Destes títulos, qual você prefere que venha à frente?

“Ah, professor...”

...e qual garante seu sustento hoje?

“...ah, não, o único que aceito é o de professor... Claro, palestrante, também, inequivocamente, sou palestrante. Vamos dizer que eu fui professor por 30 anos, continuo sendo, embora aposentado da universidade e sou hoje palestrante. Eu recuso a nomenclatura de filósofo, de pensador. Tudo isso deve ser para outras pessoas mais sábias que eu".

Ou mais envaidecidas?

“...não, sei lá, acho que mais sábias mesmo. Eu não sou filósofo coisa nenhuma. Quando muito que eu consigo é explicar de maneira interessante o que os filósofos disseram, o que já é bem legal. Mas, eu? Filósofo? Não! Para ser sincero não tenho nem saco para isso. Estes caras são muito inteligentes (diz com tom irônico), muito fora da curva. Eu sou totalmente na média. Agora tenho certa habilidade didática e de comunicação, só isso.

Seu mais recente trabalho é uma parceria com Leandro Karnal. Ele, junto com Clóvis de Barros, Mario Sérgio Cortella e Luiz Felipe Pondé formam uma equipe de palestrantes, um rol de pensadores hoje no Brasil.

“Você insiste! Eles são os pensadores, eu não (risos). Quem me botou no meio destes caras, errou completamente!,” (risos)

Eu ia perguntar, (risos) a filosofia se tornou fenômeno pop?

“Acho que o fato de as pessoas conseguirem explicar para as outras de forma simples algumas ideias, é muito positivo, é melhor do que nada. Se para isso é preciso, aqui ou acolá, não ser tão rigoroso, que seja assim. Pois é ou isso ou nada. Antes, ninguém tinha acesso a nada. Agora, as pessoas tem uma vaga ideia do que os outros disseram e cada um cumpre seu papel. Se eventualmente falta um pouco de rigor, não é tão fácil assim você traduzir para todo mundo entender, ideias tão complicadas. Acho que as pessoas que você citou são incríveis.

"Acho Cortella um palestrante excepcional, o Leandro um intelectual incrível, um historiador sensacional, de mão cheia, preparadíssimo. Acho o Pondé um cara com uma habilidade de provocar e fazer pensar ímpar e inigualável. Estes três são muito bons".

E o Clóvis pelo Clóvis?

“Eu...tenho certa competência para o entretenimento, sabe? Eu começo a falar e as pessoas gostam de me ouvir. Eu ensino coisas simples, só que pelo fato de serem simples elas acabam se surpreendendo. Sabe aquela coisa de algo que todo mundo sempre pensou, só faltava alguém para dizer? Então, é meio que o ovo de Colombo. Talvez eu tenha algum mérito, pois algumas pessoas se sentem bem em me ouvir e pensar nas coisas que falo. Por isso podem elas passar a viver de maneira diferente e então terei cumprido um papel, mas não um papel de grande pensador ou filósofo.

Acho que se você perguntar para os três, talvez eles não se sentiriam tão confortáveis com essa pomposidade toda”.

Do ponto de vista da ética e da comunicação. Percebe-se que na internet há uma gama de leitores sempre muito raivosos, sempre prontos a atacar. Como o senhor percebe isso, do ponto de vista filosófico?

“Essa diversidade de pensamento sempre existiu, agora o que há e certa facilidade para se manifestar. Espero que seus leitores não fiquem raivosos comigo não, não disse nada que possa despertar muita raiva. Acho até que muitas das críticas que recebo são completamente infundadas, pois às vezes sou apresentado como alguém da esquerda, não sei o que. Gozado, para quem vive do mercado como eu, aplaudido, tendo seu trabalho avaliado e valorado pelo mercado, é esquisito. Tendo a achar o mercado ótimo, até porque ele gosta muito de mim.

Também as pessoas fazem um pacote e juntam 03 ou 04 e acham que todo mundo pensa igual. Penso que todo aquele que vê no meu trabalho motivo de crítica deveria preocupar coisas mais importantes do que eu, sinceramente.

Não tenho pretensão política nenhuma, sou professor aposentado, já não dou mais aula e minha vida de palestrante deve durar mais um ano ou dois.

Por quê?

“Ninguém aguenta esse ritmo e tenho uma deficiência visual que dificulta muito meus deslocamentos. Hoje enxergo mais ou menos 14% de uma pessoa normal. Então, me criticarem, acho que estão gastando vela com mau defunto. Mas, também se quiserem me xingar...acho que a democracia é boa, pois permite que até mesmo quem não gosta dela a possibilidade de falar”.

Professor, do ponto de vista da ética, o que se pode dizer de um presidente que peça para que a AGU interfira em benefício de interesses particulares de políticos aliados?

“A sua pergunta já tem a resposta, não é? Eu só posso concordar com a resposta que a pergunta insinua. O servidor público está ali em nome da sociedade para agir de maneira a administrar da melhor forma possível para a sociedade. Essa necessidade é ainda mais premente para um país pobre como o nosso, onde sabidamente não há dinheiro nem recursos para todo mundo. Assim, todo e qualquer recurso, tempo de trabalho ou decisão administrativa deve usar do máximo de racionalidade e inteligência possível para beneficiar o maior número de pessoas possível.

Logo, se você vê alguém perdendo tempo para interceder a favor de alguém que está ali para servir e não para ser servido, evidente que isso não pode ser aplaudido por ninguém”.

A intenção do Político é sempre atender desejos. Nesse raciocínio, podemos pensar que o sistema que temos é, então, viável?

“No final das contas a política é, digamos, uma forma coletiva de gestão da satisfação dos desejos e como não dá para satisfazer o desejo de todo mundo o tempo inteiro, a política é uma definição coletiva e quase sempre conflituosa de que desejos nós vamos satisfazer e quais ficarão chupando o dedo.

Bom, sendo assim, é normal que haja insatisfeitos sempre. O que é preciso é que as decisões políticas tenham legitimidade, isto é, aquele que hoje não teve seu desejo satisfeito, que acate a decisão que lhe é desfavorável hoje, na expectativa de que essa decisão possa ser favorável a ele”.

Estamos falando de interesse egoístico ou social?

“Na verdade cada um quer o melhor para si e cabe à sociedade administrar da melhor maneira possível, então digo dentro de uma perspectiva egoísta mesmo. Cada um, no final das contas, gostaria que a sociedade existisse de maneira à que ele se desse bem, propriamente, da melhor maneira para si. Portanto, a política, diante desta pluralidade de interesses incompatíveis e da impossibilidade de satisfazer a todos, a política é uma solução entre infinitas possíveis, de satisfazer alguns desejos e não outros”.

A linha entre o desejo público e o privado é muito tênue e daí vem toda a problematizarão da política, não?

“Exato, toda e qualquer tomada decisão é um cobertor curto e não tem cobertor para cobrir tudo, não importa o que você decidir, desatenderá para poder atender, resta saber que interesses você vai atender e desatender. Mas que não como atender todos, é uma premissa óbvia, não tem para todos, alguém vai ficar chupando o dedo. Assim, o grande conflito é justamente para decidir quem é o chupador de dedo da vez. Aí acho que a relação de forças na sociedade é até que bem clara, o que chama a atenção é que nem sempre a sociedade tem consciência e lucidez de quem está sendo contemplado naquele momento e quem não está, além de quais são as estratégias para que isso mude ou permaneça...era isso?”.

Era exatamente isso.
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