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Quarta-feira, 24 de julho de 2024

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comissão de igualdade racial

"Nunca foi fantasia ou comédia, sempre foi racismo", afirma advogado sobre 'nega maluca' e blackface

Foto: Imagem ilustrativa

O advogado e vice-presidente da Comissão de Defesa da Igualdade Racial da OAB-MT, Leonardo Prado, explicou que "blackface", ato de pintar o rosto com tinta preta para ridicularizar pessoas negras, e a "fantasia de nega maluca", são práticas racistas. 


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O assunto veio à tona depois que, no sábado (20), a empresária do agronegócio Caroline Scheffer, uma das fundadoras do Grupo Scheffer, praticou blackface para se vestir de "nega maluca" em uma festa a fantasia. 

O evento aconteceu na sede do Grupo Bom Futuro, em Cuiabá. Em fotos publicadas por outroas convidados nas redes sociais, Carolina, que é branca e tem cabelo loiro, aparece com o rosto pintado com tinta preta e peruca de cabelo afro. Nos comentários, amigos chegam a elogiar a "criatividade" da empresária.

Ela ainda usou luvas e meias pretas para simular uma pele negra na "fantasia". A personagem "nega maluca" surgiu no Carnaval brasileiro e é marcada pela ridicularização da mulher negra. Leonardo, que também pesquisa sobre racismo, apontou que o blackface surgiu no século 19. 

Na época, atores brancos usavam carvão para pintar o rosto e representarem pessoas negras em peças de teatro ou outras manifestações artísticas nos Estados Unidos. A população negra não podia subir nos palcos e eram representados através de estereótipos. 

"Toda essa situação de se pintar, de ridicularizar, recaía numa posição totalmente negativa para pessoas negras que não podem, de nenhuma forma, retirar a pele, o nariz ou os lábios. Essa prática foi utilizada no sentido de trazer a 'comédia', mas que ridicularizava pessoas que já ultrapassavam diversas camadas racismo". 

De acordo com Leonardo, estudiosos atualmente cunharam práticas como o "blackface" de racismo recreativo. Ou seja, camuflado pelo "humor" e a "falta de intenção de ofender", reforça o racismo estrutural na sociedade. 

"Você traz a pessoa negra enquanto entretenimento, para pessoas brancas rirem de seus aspectos físicos e da sua cor. A prática é totalmente racista. Havia uma ideia de que aquilo seria uma fantasia, mas não é. Sempre foi uma atitude que reforçou o racismo que sempre estruturou a sociedade". 

Para Leonardo, apesar de não ser possível escalar as práticas racistas que são mais ou menos graves, práticas do racisto estrutural coloca pessoas negras como chacota. 

"É tratar aquilo como entretenimento. Sendo que você está ridiculizarizando vidas, pessoas e uma população que já perpassa por diversas outras dificuldades. Agora, no meio artístico ou em uma festa também é usada como chacota ou fantasia de alguém". 

Blackface e legislação 

Leonardo ressaltou que blackface não é ato disposto como crime na legislação brasileira. No entanto, a Lei 7.716/89, possui um artigo que dispõe sobre práticas que induzem ou incitem a discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, prevendo pena de reclusão de 1 a 3 anos, além de multa. 

"Não consigo afirmar que blackface recairia em um crime, mas os atores judiciais entendendo que foi uma prátic,a caíria nessa tipificação. Tendo enquanto vítima a sociedade. Não há como falar que recairia em crime, dá para falar é que estamos diante de uma prática estrutural, de racismo recreativo, totalmente ultrapassada". 

De acordo com Leonardo, o Poder Judiciário está "abrindo os olhos" para as camadas que envolvem o racismo e que muitas vezes acontecem de forma sutil. 

"O racismo é tão perverso, possui tantas camadas, que as vezes se colocam de forma até meio invisível, a discussão, a ampliação do debate, o conhecimento é necessário todo dia, de forma responsável e agregadora em sociedade". 

O advogado citou como exemplo o caso da deputada federal Bia Kicis (PL-DF), que usou as redes sociais para criticar um processo seletivo da Magazine Luiza reservado para afrodescendentes.

Na postagem, a parlamentar publicou uma montagem com os ex-ministros da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro (Podemos) e da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM), com cabelos crespos e os rostos pintados de preto, insinuando que eles fingiriam ser negros para conseguir uma vaga no programa.

"Sei que já chegou no Supremo Tribunal Federal (STF), uma discussão sobre a deputada Bia Kicis, que usou uma foto para criticar uma seleção que foi feita pelo Magazine Luiza somente para pessoas negras. Ela utilizou dessa foto para critica. Foi levado ao Poder Judiciário, trazendo a discussão do termo blackface. Ou seja, [ o assunto] bateu nas portas do Judiciário". 

Comissão de Defesa da Igualdade Racial

O advogado explicou que a Comissão de Defesa da Igualdade Racial da OAB-MT possui atuação principalmente pedagógica, dentro e fora da instituição. Para ele, em 2022, a sociedade já deveria ter uma percepção sobre os crimes de racismo. 

"A nossa atuação é de levar cada vez mais esse conhecimento, essa discussão e essa formação. Seja no sentido de descriminação no ambiente do trabalho, situações de discriminação racial por meio de violência, discussão sobre blackface ou sobre falta de acesso da mulher negra". 
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