Presente na vida do agente socioeducativo Alexandre Miyagawa, de 41 anos, desde os primeiros dias de vida, Ilka Souza, descreve "Japão", como era conhecido pelos mais próximos, como carinhoso e amoroso. A mulher é sogra de uma das tias de Alexandre e afirma que a família ficou revoltada ao ver as imagens dele sendo baleado nas costas pelo vereador de Cuiabá, Marcos Paccola, que é tenente-coronel aposentado da Polícia Militar, na última sexta-feira (1º).
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"Vi o vídeo, aí que me revoltou mais ainda, não tem palavras. Uma pessoa fazer isso sem perguntar, sem chamar... dar um tiro nas costas. Todo mundo está muito triste", lamentou Ilka.
O agente era conhecido como "Japão" pela descendência e por ter morado alguns anos no país asiático. Entre os amigos, Alexandre é lembrado pelos conselhos e pela parceria, conta Ilka, que era considerada como avó por Japão.
"Era amoroso, carinhoso, trabalhador... sempre uma pessoa maravilhosa, sempre, sempre, sempre. Não é porque ele morreu que estou falando isso, é algo verdadeiro. Tanto que todos os amigos dele saíam chorando muito do velório, ele era uma pessoa maravilhosa".
Ilka explica que Alexandre se mudou para o Japão em busca de oportunidades de trabalho, que fizeram com que ele permanecesse no país. Em 2017, ele começou a trabalhar como agente socioeducativo no Pomeri, em Cuiabá.
"Os meninos do Pomeri tinham paixão por ele, era um amor. Trabalhava lá desde 2017, mas fez concurso e passou. Tinha um ano e meio. Ficou muito feliz, foi uma maravilhosa. Gostava muito do que fazia, nossa... você nem imagina".
Tiro pelas costas
Apesar de estar se mantendo forme, conforme conta Ilka, a mãe de Alexandre, de 66 anos, e o único irmão dele estão abalados desde o dia do crime. Naquela noite, ela se lembra de ter recebido um telefonema contando sobre a morte.
Desde então, ela afirma que os familiares vivem dias de desespero. Para Ilka, o que aconteceu com Japão foi "uma ingratidão". Ela diz não entender o motivo pelo qual Paccola foi liberado após o crime.
"O cara foi dar depoimento e não ficou preso? Presta atenção, onde esta nossa lei? Tinha que ter ficado preso na hora. É muito triste o que aconteceu, estou indignada com a lei de deixar essa cara. Foi um menino que se criou junto com meu filho, precisa ver o desespero do meu filho, o desespero da família. A dor de
ficar solto ainda, falar que faria outras vezes".
Apesar do pedido de Justiça, Ilka afirma estar descrente, já que Paccola foi liberado após o homicídio. Para ela, mesmo que ele perca o mandado de vereador, Alexandre não terá a vida de volta.
"Estamos muito revoltados, a família não está em paz, a dor é muito grande. Nem quero que chegue na minha frente [o Paccola], na frente de ninguém da família, quero ver esse homem isolado, virar cinza".
O último pedido de Ilka durante a entrevista é de que "a Justiça faça Justiça". Ela ressalta que todos da família de Alexandre eram muito unidos e estão "sofrendo calados".
"Pelo menos que ele não seja político mais, não ir mais para a PM, trabalhar para comer. Mas sei que não adianta, o dinheiro compra tudo. Vou entregar na mão de Deus, rezar para a família ter consolo, vai ser muito difícil e vai levar muito tempo".
Relembre o crime
Filmagens de câmeras de segurança registraram o momento que Paccola atirou em Japão. Em uma das imagens, o ângulo mostra o momento em que Miyagawa conversa com a namorada e saca a arma.
Ela sai andando na frente e Paccola surge na gravação e começa os disparos. Os tiros são efetuados quando o agente estava de frente para a mulher e de costas para o parlamentar.
Segundo o vereador, ele estava passando quando viu a confusão, e depois que desceu algumas pessoas disseram que o agente estava armado, com a mão para cima.
“Vi ele abaixando a arma, ela [a esposa] estava na frente dele, verbalizei 3, 4, 5 vezes [para abaixar a arma] (...) ele não atendeu a essa ordem e aí naquele momento entendendo que ele fosse atirar nela ou fazer o giro para atirar em mim eu fiz os disparos”, afirmou.
Paccola afirmou que foram feitos três disparos, mas que ele não conseguiu ver onde acertaram. Após os disparos, o vereador pediu para que seu assessor retirasse a arma para impedir que Janaina a pegasse.
O assessor, então, teria chutado a arma, e Paccola afirmou novamente para que ele pegasse. Segundo o vereador, Janaina estava muito alterada e havia risco de ela pegar o armamento, ou mesmo que Alexandre, se estivesse vivo, conseguisse alcançá-lo.