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Sexta-feira, 19 de julho de 2024

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Pugilista troca treinos por faxina e impressiona com final

Sanderson Sales Canto da Conceição tem 18 anos e é faxineiro de uma academia de lutas em São Paulo. Mesmo sem treinar, é também finalista da Forja dos Campeões, tradicional campeonato da Federação Paulista de Boxe conhecido por revelar grandes pugilistas brasileiros. Isso tudo apesar de estar competindo uma categoria acima da sua – lutador dos meio-pesados (até 81 kg). O pugilista acabou inscrito de última hora entre os pesados (até 91kg) e mesmo assim venceu três combates com destaque. Natural da Bahia, é um talento bruto que sonha em ser grande nos ringues, mas admite deixá-los pela vida de trabalhador na metrópole.


Sanderson luta desde os 12 anos de idade e há pouco mais de um mês deixou Cruz das Almas, município de 60 mil habitantes localizado a 140 km de Salvador, para se unir a Everaldo “Carrasco” Almeida, treinador que se mudara há oito meses para a capital paulista. Sem grandes perspectivas no Nordeste, ligou para Carrasco e sugeriu a viagem, que seria bancada por ele próprio. O técnico, que já estava apoiando outros lutadores baianos, arrumou mais um lugar em sua casa, que divide com outros três aspirantes em São Paulo. E assim Sanderson encarou o desafio.

Na capital paulista, fez duas semanas de treino no Centro de Lutas Ryan Gracie, no Butantã, onde conheceu Antônio Pereira Gomes Filho, o Tony. Sanderson parou com o treino quando conseguiu uma vaga como faxineiro em outra academia, Rock Fight, no Brooklyn, mesmo lugar em que Carrasco dá aulas de boxe. Apesar disso, foi convidado por Tony para competir na Forja dos Campeões, como parte de sua equipe. Por falta de vagas entre os meio-pesados, teria de enfrentar atletas de até 91 kg. Pesando 83,5 kg, Sanderson aceitou. “Resolvi arriscar, aí disse que toparia”, contou ao Terra.

O baiano venceu três lutas, todas por decisão unânime dos árbitros, e se credenciou à final, que será disputada neste sábado, a partir das 18h, no Ginásio da Associação Guarulhense de Boxe. Sanderson não soube dizer quem enfrentará – no caso, Nelson Dutra, que compete pela equipe Osan/Jab/P. Grande. Mais uma vez, vai lutar sem treinamento. Por conta do encontro com a reportagem do Terra, calçou luvas e fez 20 minutos de exercícios vestindo o uniforme da Equipe Evolução, que era comandada por Carrasco em Cruz das Almas. Quando a entrevista acabou, voltou ao trabalho fazendo serviços gerais na academia.

“Espero dar o melhor de mim. E que o resultado seja o que Deus quiser”, afirmou Sanderson, extremamente religioso. Ele não sabe o que pode acontecer se for campeão da Forja. “Essa parte aí não me falaram”, disse. Realizada desde 1941, a Forja dos Campeões foi durante anos a porta de entrada de jovens pugilistas na modalidade, e ficou conhecida por ter revelado nomes como Eder Jofre e Miguel Oliveira, que seriam campeões mundiais. Hoje em dia, recebe “novatos experientes”, que já lutaram em categorias de base. “O Tony disse que você pode fazer outras competições depois de passar pela Forja, mas não sei o que iremos ganhar. Estou por fora”.

Vida em São Paulo, sustento na Bahia

Com exceção do técnico Carrasco, Sanderson Sales dá a impressão, para aqueles que o conhecem a pouco tempo, de não ter noção de quão importante é o feito alcançado recentemente. Não contou a ninguém da Academia Rock Fight, por exemplo, que era boxeador, muito menos finalista da Forja dos Campeões. Tímido e introvertido, só confirmou as vitórias quando perguntado sobre o assunto, talvez por competir pela Equipe Tony, associada à academia de Ryan Grace, inimiga histórica da Rock Fight onde hoje trabalha. Só nos últimos dias virou foco de atenção.

Segundo Carrasco, Sanderson tem uma estrutura física muito boa para um boxeador, além de ser muito ágil, o que faz com que aguente os combates contra atletas até 7kg mais pesados. Sua técnica também foi elogiada, mas os aspectos que o treinador mais destacou foram a perseverança e a determinação, que podem fazer a diferença. “Na hora da trocação, dá aquele cansaço, aquela falta de treinar. Mas sempre procuro lembrar dos ensinamentos, respiro fundo e continuo a trocação”, explicou o pugilista.

Falta a Sanderson, por outro lado, uma visão de carreira que ele pode estar prestes a iniciar no boxe. Tem sido orientado sobre alimentação e preparação por Sandro Cardoso, que trabalha na academia, mas admite que não tem expectativas de ganhar peso porque muitas vezes nem almoça: toma café reforçado e, no trabalho, costuma fazer um lanche. Foi orientado também a cuidar melhor de sua imagem nas redes sociais, já que podem servir para busca de patrocínio ou apoio. Acima de tudo isso, no entanto, está o fato de que, para Sanderson, São Paulo não é uma aventura dentro dos ringues, mas sim o presente e o futuro de sua família.

“Independentemente do resultado da final, quero continuar treinando. Não quero parar. Se tiver que seguir carreira de atleta, se der tudo certo, vou seguir. Mas, se pela vontade de Deus, tiver que ir para outras profissões, claro que também vou. Vim para cá (São Paulo) com o intuito de ajudar minha mãe, que está desempregada, e minha irmã, que ficaram por lá (Cruz das Almas)”, explicou Sanderson Sales. O que o padrasto Amarildo não puder fazer, ele quer ajudar. Há menos de um mês como faxineiro e em período de experiência, ainda não recebeu pagamento.

Neste sábado, o lutador sabe que enfrentará de novo o nervosismo e a insegurança pela falta de treinos ao subir ao ringue. Até agora, superou isso com pensamento positivo: “tenho que fazer valer a viagem para cá, valer os ensinamentos do professor Carrasco”. A final da Forja dos Campeões pode ser um grande passo na história desse baiano de 18 anos. “Quando comecei a treinar boxe, não imaginava que poderia fazer uma carreira como pugilista profissional. Mas eu queria pelo menos tentar. Pelo menos ter a oportunidade”, relembrou.

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