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Quinta-feira, 18 de julho de 2024

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Ingressos brasileiros são caros até para o padrão europeu

Existe um movimento estranho no ar: um movimento a favor dos preços caros para elitizar o futebol brasileiro, como legado da Copa. Afinal, é de mais gentrificação que precisamos, não é mesmo? #sqn


O argumento de que a elitização do estádio permite uma arquibancada sem violência e adaptada às famílias é inteiramente falso. Não existe qualquer relação entre o valor dos ingressos e a violência no estádio. Um exemplo claro está em Vasco x Atlético-PR, o jogo da pancadaria brutal no final do Brasileirão de 2013: o ingresso inteiro mais barato era R$ 100 (R$ 50 a meia entrada). Mais caro que um jogo de Copa do Mundo categoria 4 (o ingresso mais barato custava R$ 60).

Um pequeno panorama de como está o valor dos ingressos pelo mundo.

Na Alemanha, campeã mundial, um ingresso para a decisão da supercopa alemã entre Borussia Dortmund e Bayern de Munique custa entre 15 e 69 euros – pessoas com deficiência podem pagar 9 euros. O ingresso mais caro custaria R$ 207 – um ingresso para ver Inter x Flamengo pelo Campeonato Brasileiro pode custar até R$ 287,50.

Na Itália, os ingressos para jogos avulsos da temporada ainda não foram liberados. Para ver Inter x Roma nos EUA, o ingresso varia entre US$ 39 e US$ 200. Para ver a Juventus por um ano inteiro, os valores ficam entre 220 euros (11 euros por jogo, considerando 19 jogos) e 1400 euros (77,26 euros por jogo, com 19 jogos). Para ver a Internazionale, os valores mais baratos são iguais, mas os valores mais altos são 2200 euros (115 euros por jogo). Para ver a Roma, dá para pagar 10,78 por jogo, mas com um cartão de sócio que custa 50 euros/mês.

Na França, o Paris St.Germain vende apenas pacotes de ingressos. Um pacote que inclui o clássico contra o Olympique de Marselha e outros quatro jogos já teve vendidos seus ingressos mais baratos – os mais caros ficam entre 300 e 400 euros, no máximo 80 euros por jogo. O Olympique de Marselha cobra entre 20 e 120 euros por mês para seus sócios. O Monaco cobra entre 420 e 1170 euros por um ingresso de temporada inteira para ver Falcao Garcia – entre 22 e 61,75 euros por jogo.

Na Inglaterra, os preçosficam mais salgados – mas nem tanto. O Manchester United não vende mais ingressos para a temporada, mas fixou os valores entre 31 e 53 libras para adultos sócios (a associação custa 32 libras/mês). Qualquer sócio abaixo de 16 anos paga 13 libras/jogo para qualquer lugar do estádio. Para ver o Arsenal, não-sócios podem pagar entre 27 e 129,50 libras – os valores variam pouco para sócios, que conseguem comprar os ingressos antes. O Liverpool cobra entre 28 e 59 libras por jogo, dividido em 3 categorias.

Essa pesquisa vai de encontro ao estudo da Pluri Consultoria em junho de 2013: o Brasil tem os ingressos mais caros do mundo. O alemão consegue comprar 155 ingressos por mês com sua renda média; o brasileiro compra apenas 53. É o 7 a 1 das arquibancadas.

A experiência do Corinthians, que conseguiu em um jogo comum contra o Inter uma renda de R$ 2,5 milhões, é a exceção que confirma a regra – porém, não é a regra. São muitos fatores que levam o Corinthians a ter um programa de sócio-torcedor eficiente: o programa foi criado e bem-sucedido ao mesmo tempo em que o time conquistou a inédita Libertadores e o inédito Mundial, fazendo com que o torcedor “fiel” ao programa conseguisse ingressos antes dos demais. Esse pertencimento a um “clube” de exclusividade faz com que muitos torcedores que não tenham tanto tempo para ir aos jogos mantenham suas carteiras – são 51.833 sócios atualmente. Além disso, o Corinthians está estreando o seu estádio em jogos oficiais, tem um time competitivo no Brasileiro e conta com a grandeza de São Paulo – é bem mais fácil achar 32 mil pessoas dispostas a pagar R$ 180 para ver o Corinthians em São Paulo do que para ver o Sport em Recife, para dar um exemplo.

Isso dá uma enorme vantagem ao Corinthians? Sem dúvida, e é uma vantagem que pouquíssimos clubes poderiam ter. Mesmo Internacional e Grêmio, líderes no número de sócios na atualidade (120 mil e 77 mil, respectivamente, segundo o Movimento Por Um Futebol Melhor – o número deve variar) não tem uma margem tão ampla de cobrança de preços, tanto é que em um domingo ensolarado contra o Flamengo, o Beira-Rio não lotou: 32,9 mil pessoas para um estádio onde cabem 50 mil.

Lotar os estádios deveria ser uma das principais prioridades do futebol brasileiro, ao lado da mudança de calendário. Isso porque a Copa do Mundo foi um sucesso absoluto de público e de aceitação do público que gosta e que não tinha opinião formada sobre futebol – não é a toa que, depois da Copa do Mundo de 2006, a Alemanha passou a ter as maiores médias de público e taxas de ocupação do mundo, segundo a Pluri Consultoria – o Brasil, em 34º, está atrás até do campeonato australiano.

Para lotar os estádios, é possível e necessário: aumentar o número de opções e de públicos durante a partida; melhorar a segurança; levar as partidas para horários decentes, já que a Globo não morreu nem acabou por deixar de entregar jogos no sonolento horário das 22h; racionalizar o calendário. Não é necessário: aumentar os preços dos ingressos. Os estádios de futebol já são um ambiente significativamente gentrificado – não é a toa que o DataFolha constatou que 90% dos públicos dos estádios da Copa são das classes A e B. Esse público é tão seleto que não enche nunca um estádio no Brasil. Com melhor estrutura e valores razoáveis, é bem possível conseguir uma situação de vitória dupla: estádios cheios e povo de volta. Absolutamente ninguém perde se isso ocorrer, já que os valores atuais dos estádios no Brasil são altos até para o padrão europeu.
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