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Sábado, 20 de julho de 2024

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Premiação supera preconceito e reforça papel da mulher na ciência



Nas universidades, a pesquisa dá suporte e propõe inovação ao mercado e à indústria. O problema é que, por muito tempo, devido ao preconceito, a produção acadêmica deixou as mulheres à parte, especialmente no Brasil. Mas o envolvimento feminino está aumentando, e um incentivo para que essa tendência se acentue foi entregue no dia 26 de setembro: o prêmio Para Mulheres na Ciência 2012, organizado pela L'Óreal Brasil, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e Academia Brasileira de Ciências (ABC).

A sétima edição da honraria concedeu uma bolsa-auxílio de R$ 20 mil a cada uma das sete pesquisadoras premiadas nas áreas de Ciências Biomédicas, Biológicas e da Saúde (quatro bolsas); Ciências Físicas (uma bolsa); Ciências Químicas (uma bolsa); Ciências Matemáticas. As cientistas contempladas foram Paula Murgel Veloso, da Universidade Federal Fluminense (UFF); Katiúscia Nadyne Cassemiro, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Márcia Foster Mesko, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel); Carolina Cavalieri Gomes, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Gislaine Zilli Réus, da Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc); Karin Soares Gonçalves Cunha, da UFF; e Roselia Maria Spanevello, da UFPel.

Trajetória
A pesquisa científica acompanha o início da humanidade, quando o ser humano primitivo olhava ao redor e buscava explicações sobre diversas questões da natureza, do universo e da mente. Nomes célebres como Galileu Galilei, Isaac Newton e Albert Einstein deram passos gigantes na compreensão de diversos mistérios que nos cercavam e para sempre serão inspiração aos novos cientistas. Mas, entre os que escolheram trilhar o caminho da ciência, há sempre a mesma característica em comum: a curiosidade.

"Desde pequena, eu sempre fui muito curiosa, então acho que a ciência me atraiu precisamente por ter esta pretensão de decifrar o mundo", revela Paula Murgel Veloso, premiada por seus estudos sobre anéis de grupo, estruturas algébricas. A imagem icônica dos cientistas citados acima era o que faltava para despertar o sonho de seguir essa instigante vocação. "O estereótipo do cientista retratado no cinema, na TV e na literatura sempre me fascinou. Aquela figura excêntrica, que enxerga o mundo de maneira singular, povoava minha imaginação."

Já Carolina Cavalieri Gomes, da UFMG, vencedora do prêmio pela sua pesquisa que visa a comprovar os efeitos nocivos da radiação de aparelhos celulares, considera a disciplina de Patologia Bucal, cursada quando ainda era graduanda em odontologia, o momento que despertou o seu interesse na carreira de pesquisadora. "Era uma disciplina que envolvia práticas laboratoriais e clínicas, além da discussão de casos clínicos e aulas teóricas. Até esse momento, eu não tinha nenhuma ideia do que era pesquisa e, menos ainda, do que era um artigo científico", relembra.

Karin Gonçalves Cunha, da UFF, busca, em seus estudos, desvendar aspectos pouco conhecidos da neurofibromatose, uma das doenças genéticas mais frequentes entre as pessoas. Graduada na mesma área de Carolina, Karin atribui a lembranças da infância a opção. "Lembro uma vez, quando criança, que meu pai me falou que gostaria muito de ter uma filha cirurgiã-dentista. Talvez isso tenha me influenciado de alguma forma", diz ela que, após cursar uma especialização, ingressou no mestrado em Patologia Bucodental, incentivada pelos seus professores, e iniciou aí a carreira de pesquisadora.

Para Paula, o ingresso na pesquisa foi natural. O problema, recorda, foi escolher em qual área atuar. "Eu sempre me interessei por várias coisas. Gosto um pouco de quase tudo, então o meu processo de escolha profissional foi marcado principalmente pela indecisão. Vim parar na matemática depois de flertar com outras áreas", ressalta. Para Caroline, depois da experiência na disciplina de Patologia Bucal, o momento decisivo foi o ingresso na Iniciação Científica, a convite de um professor. "Ali decidi seguir a carreira acadêmica, e hoje eu percebo que, com essa escolha, pude realizar várias expectativas que eu tinha enquanto adolescente: trabalhar com pessoas, estudar muito e compartilhar o conhecimento", conta.

Pesquisas
As pesquisas envolvem diversas áreas da ciência. Gislaine Zilli Réus, da UNESC, estuda, a partir da neurociência, a relação da depressão e ansiedade com outras doenças. O trabalho de Katiuscia Nadyne Cassemiro, da UFPE, aborda as propriedades da luz. Na UFPEL, Márcia Foster Mesko estuda a possibilidade de utilizar microalgas para absorver partículas de dióxido de titânio (TiO2) de ambientes aquáticos. Na mesma universidade, outra vencedora, Roselia Spanevello, pesquisa novas terapias para agregar qualidade de vida às pessoas portadoras da síndrome de Down.

Completam a lista as pesquisas de Paula, Carolina e Karin. "As aplicações dos anéis de grupo concentram-se principalmente na própria matemática, mais especificamente na álgebra. Mas também há aplicações na física, na química e em códigos corretores de erro", exemplifica Paula, que visa a entender quando alguns elementos especiais de um anel de grupo (os elementos simétricos sob uma involução) satisfazem ou não algumas equações, chamadas identidades de Lie.

O foco de Carolina é nos telefones celulares, massivamente popularizados na nossa sociedade. "Em nosso estudo, o que pretendemos inicialmente neste piloto é verificar se o uso dos aparelhos celulares está associado a alterações moleculares iniciais nas glândulas parótidas que estão em contato com a radiação", conta Carolina, com o cuidado de ressaltar que a população não deve ficar alarmada, pois o objetivo da pesquisa não é desestimular o uso dos aparelhos.

No caso do trabalho de Karin, o objetivo é conhecer melhor a neurofibromatose. "É uma das doenças genéticas mais comuns, com uma prevalência de aproximadamente um caso a cada 3 mil nascimentos. Imagino os resultados de pesquisas como esta trarão resultados animadores e um futuro promissor para pacientes e familiares", explica.

Preconceito
O papel da mulher no mercado de trabalho evoluiu muito se considerarmos como eram as coisas há algumas décadas. Hoje, a sociedade reconhece a importância das trabalhadoras, que têm encontrado espaço em cada vez mais setores, a ponto de que, caso o aumento na participação feminina no mercado continue no mesmo ritmo, até 2020 as mulheres ocuparão a maior parte dos cargos no País.

No entanto, ainda há muito pelo que lutar. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o salário médio dos homens brasileiros é 28% maior do que o das mulheres. Além disso, muitas encontram dificuldades para alcançar cargos de gerência e, principalmente, o preconceito. Paula conta que, embora o segmento da álgebra seja mais equilibrado, há muito mais homens na matemática do que mulheres. "Eu acho que a participação e o reconhecimento das mulheres em qualquer área apenas refletem os valores da sociedade, que é muito machista. Eu nunca passei por qualquer discriminação no trabalho por ser mulher, mas já ouvi histórias", afirma.

Karin prefere salientar as mudanças positivas das últimas décadas, mas faz ressalvas. "Aqui no Brasil, acho que o crescente número das mulheres na ciência tem mostrado que passamos por uma mudança significativa. A discriminação que existia no passado já não é tão evidente em grande parte do mundo. No entanto, ainda vemos que os cargos mais importantes são, ainda, ocupados por homens", opina.

O destaque que recebem as pesquisadoras no prêmio Para Mulheres na Ciência 2012 é uma boa maneira de chamar a atenção esse tema. "Eu acho que o caminho para vencermos este preconceito é trabalhar com muita seriedade e dedicação, e iniciativas como essa são muito importantes para mostrar o excelente trabalho que nós, mulheres, estamos desenvolvendo na ciência", sentencia Carolina.

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