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Segunda-feira, 22 de julho de 2024

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"Não queria TV", diz protagonista de 'O Brado Retumbante'

Foto: Foto: Jorge Rodrigues Jorge/Carta Z/TV Press

Domingos Montagner interpretará o presidente da República na minissérie

Domingos Montagner interpretará o presidente da República na minissérie

Negociando um contrato de prazo longo com a Globo para viver um dos principais papéis da próxima novela de Glória Perez, ele assegura que nunca pensou em fazer TV. No entanto, começou a ser convidado para pequenas participações em 2010, para tramas como Força Tarefa e A Cura, até protagonizar o seriado Divã, ao lado de Lilia Cabral, no ano passado.


Foi o bastante para chamar atenção e começar a ser visto como um galã, principalmente após seu destaque como o rústico Herculano. Agora, Domingos troca o pesado figurino de cangaceiro pelos irretocáveis ternos italianos de Paulo Ventura. Na história de Euclydes Marinho, o ator vive um advogado mulherengo que se torna presidente de um Brasil fictício. Avesso à corrupção e íntegro em seus atos políticos, o personagem reconstrói o casamento com Antônia, de Maria Fernanda Cândido, para comandar o país.

"Se hoje eu estou na TV, é pela minha história. Esse reconhecimento traz novos conhecimentos. É um avanço. Em vez de estagnar a minha história bem-sucedida no circo e no teatro, começo meu caminho na TV. E um novo horizonte se descortina com novas relações profissionais", ressalta, quase em tom de discurso.

TV Press - Você tem uma longa trajetória no teatro e no circo e uma breve carreira na TV, de menos de dois anos. Por que levou tanto tempo para fazer televisão?
Domingos Montagner - Nunca programei fazer TV, em virtude do meu trabalho no teatro e no circo, que envolviam grande parte do meu tempo e da minha dedicação. Não dava para focar na televisão. Para você fazer TV, tem de trabalhar para isso. Talvez, pela longevidade do meu trabalho, isso tenha acontecido de uma maneira espontânea. Fui procurado e atendi com o mesmo profissionalismo que atendi a convites em outras áreas. Demandou um esforço muito grande meu sair do teatro por um tempo para fazer televisão.

TV Press - Alguns atores de teatro ainda têm preconceito em fazer TV por considerá-la "sub-arte". Foi o seu caso?
Domingos Montagner - Nunca tive preconceito com a TV. Existem excelentes trabalhos produzidos na história da teledramaturgia e fico feliz de agora ter acontecido comigo. Sempre quis fazer bem meu trabalho, desde que comecei na carreira. Isso foi uma consequência inesperada porque sou de São Paulo e venho de uma geração muito distante da TV. Quando comecei minha carreira, a tevê era impensável porque o maior núcleo de teledramaturgia estava e está no Rio. Não tinha tempo de pensar nessa projeção. Minhas expectativas sempre foram ligadas ao teatro. Com o tempo, houve uma procura dos diretores de tevê pelos atores de teatro e a busca por essa diversidade. Aí, acabou acontecendo comigo.

TV Press - Neste início, você foi chamado para pequenas participações em seriados, até se destacar em Cordel Encantado. Agora estreia como protagonista em O Brado Retumbante. Imaginava um percurso tão rápido na TV?
Domingos Montagner - Fazer o Paulo Ventura me gerou uma ansiedade e um senso de responsabilidade bem aguçados. Fiquei muito feliz e emocionado por, logo no meu segundo trabalho de destaque na TV, viver o protagonista. Fiquei sinceramente lisonjeado e feliz porque a minissérie e o assunto são muito bons. E o papel também.

TV Press - De que forma você se preparou para construir um personagem que é presidente da República?
Domingos Montagner - Ele não é um político de carreira, não tem cacoetes e perfil de um político. Não procurei me espelhar muito nos políticos. Lógico que fiz uma observação muito grande desse meio, do comportamento das pessoas, das oratórias. Talvez mais para fugir das características deles do que para cair nelas. Procurei fazer uma composição em cima da trajetória do personagem na minissérie. Como se aborda muito a vida pessoal do Paulo, ele tem nuances fantásticas criadas pelos autores. Ele é político, pai, esposo, amigo, amante. Tem vários componentes mais pessoais em que procurei me ater, muito mais na personalidade dele do que em um político especificamente.

TV Press - Mesmo assim, houve inspiração em alguém do cenário político?
Domingos Montagner - Não. Procurei me afastar mesmo de qualquer semelhança. Essa é a essência dele, é um político completamente diferente. Ele é um anti-herói. Não tem perfil de herói, mas tem um ímpeto, uma ética de herói. Nos padrões normais, é um anti-herói fascinante. Eu prefiro que ele seja assim. Acho mais rico dramaturgicamente para compor. Apresentando conflitos, ele se torna mais humano. O grande valor dele é ser essencialmente humano. Ele é extremamente ético e não se mete com corrupção.

TV Press -
Você poderia se considerar um ator politizado? Se interessa por política?
Domingos Montagner - Gosto do assunto. Acho que é importante acompanhar, mas dentro das nossas possibilidades de conhecimento e participação. A história da minissérie mostra diversos assuntos cotidianos. É uma história fictícia, que aborda temas políticos, não especificamente só brasileiros. Você vai poder localizar fatos políticos do mundo inteiro na minissérie. Também não cabe a mim analisar o nosso momento político no Brasil. Isso é muito complexo para ser conversado em uma entrevista.

TV Press - Sua visão política ficou mais aguçada com o personagem? Você passou a ler mais sobre o assunto, por exemplo?
Domingos Montagner - Não. Meu interesse como cidadão pela política continua sendo o mesmo. Fiz um processo de estudo em relação ao personagem, como procurar exemplos de líderes. Não gosto muito de encharcar os personagens de informações quando estou criando. Confio muito no meu instinto e converso bastante com o diretor. Gosto de ler o personagem, pensar muito sobre ele, construi-lo na minha cabeça e, só depois, buscar as referências. Esse é o meu caso. Cada um tem um processo de criação.

TV Press - Sua opinião sobre o meio político mudou após a minissérie?
Domingos Montagner - Não. O objetivo da minissérie não é mudar a opinião política dos atores. É um momento de reflexão, de posicionamento político. Não só brasileiro, mas do posicionamento como indivíduo. Você tem de ficar atento para o movimento político na sua vida, porque ele engloba tudo que nos cerca, onde quer que você more. Não posso me aprofundar a falar sobre política porque eu não sou ligado diretamente a ela, não posso falar com propriedade porque não tenho experiência política. Teria de analisar muito bem o cenário político para emitir uma opinião.

TV Press - Na trama, um dos filhos do seu personagem, o Julio/Julie (vivido por Murilo Armacollo), é transexual. Como vai ser abordada essa paternidade?
Domingos Montagner - É uma discussão muito interessante. Um dos grandes méritos da minissérie é lançar os assuntos e deixar para o telespectador julgar, pois a trama não estabelece julgamentos. Isso é muito legal. São assuntos que não são solucionados de uma maneira normativa ou maniqueísta. Ela deixa assuntos para o público refletir. O tema do filho transexual é tratado com cuidado e carinho entre os personagens.

Tv Press - Após Cordel Encantado, você passou a ser visto também como galã pela emissora. Como reagiu a essa classificação?
Domingos Montagner - Isso nunca me passou pela cabeça. Me preocupei sempre em me concentrar na excelência profissional.

TV Press - Mas como tem sido ser considerado um galã nessa altura da carreira?
Domingos Montagner - Mudou minha relação com muitas coisas. Meu foco, na verdade, é a gratidão por ter entrado em um outro meio profissional. A Globo tem me reconhecido muito, o que tem sido importante para mim, para meu trabalho de ator, pelo que venho desenvolvendo no circo e no teatro há tantos anos. É um novo meio de trabalho. Estou agregando um novo conhecimento ao meu ofício como ator e isso está me trazendo bastante satisfação profissional. Estou conhecendo gente bem interessante na Globo, na parte técnica e artística.

TV Press - Como você reagiu ao destaque que teve em Cordel Encantado?
Domingos Montagner - A repercussão foi muito boa, além do que eu esperava. Houve, sem dúvida, essa história de passarem a me ver como galã. Esse universo de chamar atenção pelo físico é muito mais forte e presente na TV e no cinema do que no teatro. Trato isso até com uma função dramatúrgica. Acho que o galã tem um papel na dramaturgia e tento cumprir esse papel dentro do espírito dramático exigido em novela ou minissérie. Mas minha preocupação é, obviamente, a essência do personagem. Quando a gente começa a se envolver com o papel e percebe o que nossa imagem provoca no imaginário das pessoas, pode começar a confundir o trabalho com a fantasia e aí se perder. Então prefiro me ater ao meu trabalho.

Paixão burlesca
A estreia na TV trouxe não só o reconhecimento profissional em outra área da dramaturgia, mas também a valorização do trabalho circense e teatral de Domingos Montagner. Há pouco tempo experimentando uma repercussão popular por seus trabalhos na TV, o ator já começa a perceber as agradáveis consequências da fama em suas peças, que estão mais cheias após Cordel Encantado.

Mesmo com produções itinerantes pelo Brasil, o ator tem notado o reflexo de sua aparição na TV. "Quando as pessoas sabem que vou estar em determinada cidade, gera um rebuliço. Isso não dá para ter dúvida. O alcance da TV se reflete nesses momentos", admite o ator, que se prepara para uma nova estreia teatral.

Em março, Domingos estreia O Mistério Bufo em São Paulo, com a companhia teatral que divide com o ator e amigo Fernando Sampaio, La Mínima. A peça, do dramaturgo e escritor Dario Fo, Prêmio Nobel de Literatura, é baseada nos mistérios medievais contados pelos bufões.

"Sempre sonhei em montar uma peça dele, que é um dos dramaturgos contemporâneos mais importantes e tem uma forte ligação com a 'commedia dell'arte', assim como eu", explica Domingos. A paixão do ator pela comicidade começou com seu envolvimento com o circo, em 1990. De lá para cá, Domingos montou o Circo Zanni e desenvolveu um trabalho aprofundado sobre o estudo do palhaço. Até montar a peça A Noite dos Palhaços Mudos, com sua companhia, que ganhou o Prêmio Shell em 2009 de Melhor Peça e Domingos recebeu o prêmio de Melhor Ator.

"Talvez agora eu não consiga estar tão presente como eu gostaria na companhia, mas minha ideia é sempre conciliar o teatro com o circo, independentemente do meu trabalho na TV", avisa.
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