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Terça-feira, 21 de maio de 2024

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Livro tenta explicar porque alguns ambientes favorecem bem-estar e cura

Digamos que você esteja vivendo em um ambiente que não é ideal. Seu vizinho de cima frequentemente muda os móveis de lugar, de madrugada. O cachorro do apartamento da frente é solitário e late alto. O dono dele resmunga quando você passa. Sua sala de estar tem o formato errado, as janelas estão no lugar errado, a cor da tinta, que parecia tão criativa e chique há cinco anos, está lhe dando nos nervos.


Aí você se muda. Enquanto você mergulha no silêncio e na simetria, com vizinhos agradáveis, uma vista incrível e paredes brancas e calmantes, algo se acende no seu cérebro. Ou será que se apaga? De qualquer forma, você se sente muito bem.

Afinal, o que causou o acendimento? Essas são perguntas enganosamente fáceis que Esther Sternberg tenta responder em "Healing Spaces" (em tradução livre: "Espaços que Curam"), uma exploração sobre as influências ambientais no cérebro, no corpo e (com todo o respeito por sua nova situação de vida, mas existem assuntos mais importantes no momento) o curso da doença física e mental.

Sternberg, célebre neuroimunologista do Instituto Nacional de Saúde Mental, propôs a si mesma uma tarefa gigante, incorporando arquitetura, estética, psicologia, neurobiologia, fisiologia e aromaterapia, entre várias outras disciplinas. Ela não tem tanto sucesso na tarefa, mas seu esforço define os parâmetros complexos do que pode ser um dos maiores mistérios remanescentes da ciência médica.

Depressão

Afinal, se seu cérebro pode deixá-lo depressivo em uma sala de estar, imagine o quanto as coisas provavelmente pioram em um típico quarto de hospital, cercado de barulho, confusão, cheiros desagradáveis e vistas nem um pouco belas. Você achava que uma ciência tão adepta a examinar o cérebro encontraria uma forma de acalmá-lo com a mesma destreza.

No entanto, o circuito neural responsável pela tranquilidade mental, apesar de essencial, é incrivelmente complexo. Além disso, a ciência que descreve a relação entre a estética e o bem-estar físico – a famosa conexão mente e corpo – é experimental e controversa. A maioria dos tratamentos ainda tem de ser rigorosamente avaliada.

Tudo começa com os cinco sentidos. É lá onde Sternberg também começa: "Se você fosse um paciente em uma cama de hospital, acabando de acordar de uma cirurgia, o que preferiria ver quando abrisse os olhos – uma parede de tijolo ou uma fileira de árvores?"

Você pode pensar que sabe a resposta certa e a justificativa para ela, mas considere todas as variáveis que os cientistas devem considerar para analisar sua decisão. Entre elas, estão a posição dos tijolos e das árvores (partes distintas do cérebro cuidam da percepção de próximo e longe) e as cores envolvidas (sua visão verde-amarela foi a primeira a evoluir; será por isso que o verde nos agrada tanto?). Pacientes diferentes podem ter respostas condicionadas diferentes a tijolos e árvores.

Além do mais, será que visões de jardins realmente ajudam a curar incisões abdominais? Alguns estudos menores sugerem que sim, mas será que as descobertas podem ser generalizadas para todos os pacientes, todos os tijolos e todas as árvores? E pacientes míopes, paredes de tijolo ensolaradas e árvores morrendo?

Som e cheiro

Isso é apenas o começo. O som e o cheiro também devem ser considerados. E existe também a noção de lugar, orientação espacial e direção, uma experiência composta tão afinada que se perder em um lugar estranho e escuro (como o porão do hospital, a caminho da radiologia) pode trazer o pior tipo de estresse. Caminhar lentamente e intencionalmente ao longo de corredores alinhados de um jardim-labirinto é receita de tranquilidade.

Dá o que pensar considerar que, entre todas as grandes mentes que exploraram esse fenômeno, Walt Disney foi, provavelmente, o que mais obteve sucesso na manipulação em larga escala do ambiente para acalmar e alegrar o cérebro. Mesmo os brinquedos assustadores da Disneylândia – Sternberg desconstrói o "Piratas do Caribe" do ponto de vista científico – são cuidadosamente projetados para acender as faíscas certas do cérebro nas direções certas.

Da mesma forma, uma nova casa de repouso tem uma rua principal à la Disneylândia para acalmar os neurônios em deterioração dos seus residentes. Isso está a um pequeno passo neurológico de Lourdes, na França, lugar de curas milagrosas, onde um conjunto de fatores ambientais pode acender cérebros adequadamente preparados e levá-los a um estado de êxtase, liberando um fluxo de potentes mediadores neuroquímicos capazes de aliviar o sofrimento. Assim, Sternberg delineia uma biologia experimental do milagre, que, como ela se apressa em dizer, "não diminui a maravilha do fenômeno".

É missão da Academia de Neurociência para Arquitetura, cujas conferências oferecem a Sternberg um material fascinante, simplesmente reproduzir um pouco de Lourdes em cada cenário médico. Éramos bem melhor nessa tarefa do que somos hoje; a medicina do século 20, com seu medo mortal de germes, interferiu. Entretanto, em algum ponto, "estéril" passou a ser uma característica ruim, e agora tentamos recapturar um pouco da grandiosidade e da beleza de hospitais antigos, com janelões, jardins e belas vistas.

Sternberg é uma escritora seriamente entediante, e sua narrativa nunca desvia de uma brandura intencionada para não ofender nem aos cientistas mais radicais, nem aos místicos new age. Ela ignora alguns dos paradoxos mais complexos da área (uma ala hospitalar com 30 camas pode oferecer mais privacidade e tranquilidade que um quarto compartilhado com outra pessoa; e mais, a aromaterapia de uma pessoa muitas vezes causa enjoos no paciente ao lado). Ainda assim, qualquer pessoa que já sentiu a paz se instaurar em ambientes agradabilíssimos poderá encontrar algumas sementes de explicações em seu livro.

'HEALING SPACES: The Science of Place and Well-Being'

Esther M. Sternberg
The Belknap Press of Harvard University Press
343 páginas.
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