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Segunda-feira, 29 de julho de 2024

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'O Visitante' mostra 'ilha' multicultural na Nova York pós-11 de Setembro

Walter Vale vive. Tem um cargo de prestígio em uma boa universidade, desenvolve um trabalho de pesquisa e mora em uma bela casa de subúrbio. Até hobby ele tem: toca (mal) piano. Até que um dia é pressionado a participar de um evento acadêmico em Nova York, onde tem um apartamento. Ao chegar lá, encontra dois inesperados "visitantes": um músico sírio e sua namorada, uma artista plástica senegalesa. 


Richard Jenkins e Hiam Abbass em cena de ''O visitante'' (Foto: Divulgação)
Sendo "O Visitante" um filme americano, a história poderia facilmente seguir dois caminhos: virar uma comédia "peixe fora d'água", em que cenas de pastelão se seguem a partir das mais óbvias diferenças culturais entre os personagens. Ou então o professor poderia pegar uma arma na mão e lutar contra os dois "invasores", os aliens que ocuparam o seu espaço.

Escrito e dirigido por Tom McCarthy, que antes já havia feito o excelente "O Agente da Estação" - sobre um anão que faz amizade com um vendedor de cachorro-quente em uma pequena cidade americana -, "O Visitante" foge, entretanto, de clichês óbvios e de outros nem tão óbvios também.

É a partir de sua reação à presença dos imigrantes - "ilegais", como se diz popularmente, ou "sem documento", na definição correta - que o espectador conhece (e passa a admirar) Walter, vivido magistralmente por Richard Jenkins, indicado ao Oscar de melhor ator deste ano. Embora tenha direitos sobre o apartamento - afinal, ele é o proprietário -, o professor dá aos "invasores" a chance de se explicarem: eles haviam sido enganados por um corretor mau caráter.

Na Nova York pós-11 de Setembro, Walter concorda em transformar dois estranhos - estrangeiros e desconhecidos - em bem-vindos visitantes. Ao acordar, descobre que o sorridente Tarek (Haaz Sleiman, excelente) é um percussionista que ganha dinheiro nas ruas da Big Apple. Sob os olhos da desconfiada Zainab (Dainai Guirra), uma aproximação se inicia. O professor, um fracasso completo no piano, logo se interessa pelo novo instrumento.

O arranjo de uma noite logo passa a se estender, e a convivência dos três, sempre pontuada por uma dose de desconforto, acaba evoluindo para uma "quase-amizade". Enquanto Zainab mantém-se distante, Tarek logo convida Walter a participar de suas jam sessions com outras dezenas de imigrantes de diversas origens. Antes que o filme perca o conflito, porém, a realidade desaba sobre a cabeça dos personagens.

Um incidente desimportante envolvendo um bilhete de metrô acaba resultado na prisão de Tarek, que vai parar em um centro de triagem para imigrantes sem documentos. Logo, a aparente harmonia se dissolve: em busca de segurança, Zainab vai morar com uma prima. Para piorar, não pode visitar o namorado, pois provavelmente teria o mesmo destino com ele. Assim, o único elo entre Tarek e o mundo passa a ser as visitas de Walter.

A esta altura, o filme introduz a mãe de Tarek, que vem a Nova York visitar o filho, aparecendo um dia na porta de Walter - que a esta altura decidiu permancer na cidade e ajudar na liberação do amigo e professor de batuque. Vivida pela atriz israelense Hiam Abbass, a mesma de "Lemon Tree", Mouna é uma presença sofrida, sábia e levemente sensual, que balança a vida do professor de uma vez.

O clima de romance que se instala também é tratado com sobriedade, embora a química que emerge das cenas em que Walter leva Mouna para ver uma peça da Broadway e para um jantar em um bom restaurante seja inegável. "O Visitante", porém, é parecido demais com a vida para mergulhar em soluções fáceis. O final é agridoce, mostrando que de tudo na vida - até a distância de um filho - pode-se tirar algo de positivo.

Apesar do bom roteiro, o filme só atinge patamar superior graças a Richard Jenkins, um ator que trabalha há três décadas e apareceu em filmes como "As Bruxas de Eastwick", "Poder Absoluto" e no recente "Queime Depois de Ler". As tranformações de Walter são mostradas com discrição - Jenkins é bom o bastante para não pedir a simpatia da platéia, mas para conquistá-la. Espera-se que sua entrada para o rol dos grandes intérpretes americanos seja definitiva, e não apenas uma breve visita.
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