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Sexta-feira, 26 de abril de 2024

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Patriarcado sustenta violência contra a mulher, afirma desembargadora

Foto: Rogério Florentino/Olhar Direto

Desembargadora Maria Erotides Kneip.

Desembargadora Maria Erotides Kneip.

Aconteceu no último dia 26 no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), um encontro para discutir a violência doméstica e o feminicídio. Para a desembargadora Maria Erotides Kneip, presidente do Colégio de Coordenadores da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário Brasileiro (Cocevid), o patriarcado sustenta a violência contra a mulher. Ela acredita que pedir ajuda é a melhor maneira de romper o contexto de violência.


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“Nós temos violência contra a mulher de forma tão sutil que ela sequer levou um tapa, mas a violência é tão forte que a mulher permaneça nesse contexto de violência, que é a violência psicológica. Nós temos que trabalhar culturalmente, sim. Nós ainda temos um caldeirão de cultura criada pelo patriarcado, que sustenta ainda essa violência”, disse.

Ela pontua que é necessário procurar ajuda para sair deste contexto. “É muito importante que ela procure uma ajuda profissional e técnica. Nós temos os profissionais que são capacitados para ajudá-la, para que ela saia de uma vez. Não adianta ficar ensaiando, que ela saia e denuncie, procure ajuda. Que ela saia, denuncie e que vá procurar ajuda, porque só assim a mulher consegue sair. É um contexto que amarra. Se ela não procurar ajuda, ela não consegue sair".

Entre janeiro e agosto de 2019, foram cometidos 59 homicídios envolvendo vítimas femininas. No mesmo período de 2018, foram 53 casos. A desembargadora considera os números preocupantes. “Preocupa porque hoje nós nem dizemos que a mulher vive mais em um ciclo de violência, mas que ela vive em um contexto de violência, que é muito difícil de vencer”.

Para ela, a lei precisa ser melhor aplicada. “Quando essa lei for mais bem aplicada eu penso que isso muda. Nós temos instrumentos, sim, instrumentos legais. O que a gente precisa é que sejam aplicados em sua grande extensão, na sua totalidade de extensão. É necessário, por exemplo, que as mulheres sejam realmente representadas, que elas não sejam revitimizadas, que sejam ouvidas com respeito, sem julgamento de quem faz isso. Preciso que ela seja aplicada em toda sua integridade. Instrumento a gente tem”, acrescentou.

A desembargadora Lenice Bodstein, do Estado do Paraná e primeira-secretária do Colégio, pontuou que a Lei Maria da Penha trouxe a responsabilidade social dos tribunais e a judicialização. “Estamos num momento histórico, tempo de mudar e de criar. Ao longo desses anos precisamos recriar e otimizar esse trabalho, que, por meio das coordenadorias, já está implementado. Poderemos aproveitar as boas práticas e trazer um trabalho de maior qualidade e também implementar junto aos nossos tribunais essas novas tendências de atendimentos”, avalia.
 
Ela também acredita que historicamente, a legislação é patriarcal. “A legislação é patriarcal. Ela já veio desde que aportaram aqui no Brasil, quando só tinham os índios. Os índios eram democráticos e igualitários. Entretanto, nos herdamos toda uma cultura européia onde o estado-igreja, estado-governo-igreja, já tinha estabelecido o poder do homem e a objetivação da mulher”, acrescentou.

“Algumas modificações foram feitas pela legislação: estatuto da mulher casada, voto. A partir do Código Civil, o último, de 2016, o que nós temos? Ali foi estabelecido, na questão da família que a administração do lar é do homem e mulher. Não tem mais do cabeça do casal ser somente o homem. Hoje a economia fortalece essa lei porque 62% da população econômica é de mulheres, chefes de família. Então não tem como a legislação deixar atender essa questão social”.

Junto com as mudanças, vieram as diferenças. “Salários menores, tempo de jornada diferenciado, a questão da maternidade, licenças, a questão da violência. A violência também se instalou com a nossa quebra da economia. Aquela função do homem provedor e da mulher administradora do lar já não deu certo, não funcionou mais. A mulher teve que ir ao mercado de trabalho”, contou.

A desembargadora acredita que o homem não estava preparado para ficar em casa. Entretanto, afirma que essa cultura precisa ser mudada. “O homem não estava preparado para ir para dentro de casa. A cultura é osmótica, está no corpo de todos nós, e as mulheres educam seus filhos da mesma forma. Então, precisamos sim mudar essa cultura. Existe? Existe. Mas o nosso país é muito diversificado. Conforme a região, nós temos a igualdade mais implantada, conforme a região não”, disse.

Conforme Lenice Bodstein, a Lei Maria da Penha, foi um ‘despertador’ para alertar que os moldes já instalados não estavam funcionando. “Como é uma lei especial, a estrutura do judiciário não estava e não está prevista a parte civil e criminal dentro de um mesmo juizado. Quando se fala em mulher, a gente está falando em uma porção de mulheres juntas. A mulher nunca vem sozinha. Ela vem com filhos, com a sogra, com a mãe, com os ascendentes… Então, são uns 100 números de pessoas a serem atendidas”.

“Isso exige uma estrutura muito além do que o judiciário pode oferecer. Não adianta uma punição ao ofensor somente. Não podemos pensar dentro dos critérios mais objetivados do direito criminal, do direito penal. Adianta para a mulher vê-lo debaixo das grades? Não, ele me fez um mal e está pagando perante a justiça, mas isso mudou. Todo o crime nós considerávamos que ele era contra a sociedade, hoje ele é além da sociedade, é contra a mulher. Isso é importante a gente perceber”.

O objetivo do I Cocevid, nos dias 26 e 27, é apresentar para o país o que vem sendo feito por cada um dos tribunais estaduais, por meio da Cemulher. “É o Brasil presente mostrando o que faz em termos de prevenção e enfrentamento a violência doméstica contra a mulher”, assinala Maria Erotides.
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