Cuiabá amanheceu tomada pela fumaça mais uma vez. Novamente, os cuiabanos tem dificuldade para respirar, ardência nos olhos e na garganta. Mas porque isso acontece? Segundo o doutor em meteorologia Rodrigo Marques, o principal problema são as queimadas, mas um fenômeno natural, chamado ‘inversão térmica’, ajuda a piorar a situação. Além disso, ele alerta que, historicamente, o pior mês da seca cuiabana é setembro, então é bom se preparar: o pior ainda está por vir.

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Rodrigo é licenciado e Bacharel em Geografia pela Universidade Federal de Mato Grosso (2005), mestre em Geografia pela Universidade Federal de Mato Grosso (2006), Doutor em Ciências (Meteorologia) pelo Departamento de Ciências Atmosféricas do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo - USP (2011). 
 
Segundo ele, com a inversão térmica, o ar frio, que é mais denso, acaba ‘aprisionando’ a fumaça: “Durante a seca, com pouca umidade do ar, existe um fenômeno parecido com o que acontece no deserto. Durante o dia, temperaturas altas, e à noite, quando a superfície respira, ela fica fria. O ar que está logo acima da superfície esfria, e acontece a inversão térmica, comum neste período. O ar frio é mais pesado, mais denso, e funciona como uma tampa, não deixa a fumaça se dispersar”.
 
A inversão térmica, no entanto, é um fenômeno natural. “Se você deixa de queimar, muda a qualidade do ar. Tanto que passou dois dias sem queimar e já deu uma limpada, mas agora voltaram, e ficou ruim novamente”, lamenta.
 
Segundo o especialista, todos os anos Cuiabá passa por este período, e o pior mês, historicamente, é setembro. “Muito pior ainda pode vir, principalmente porque esse ano está tendo pouca entrada de frente fria, e quando elas entram, ajudam a aumentar a umidade e “bagunçam” a atmosfera, ou seja, ajudam a dispersar”.
 
Rodrigo explica que, atualmente, a atmosfera está muito estável e, com isso, há pouca circulação de vento vertical. O único vento existente vem “de cima para baixo”, e é seco.
 
Porque existe a seca?
 
Apesar das quatro estações do ano, o clima em Cuiabá pode ser melhor dividido entre a cheia e a seca. Isto acontece por causa de um fenômeno denominado “Anticiclone Do Atlântico Sul” ou “Alta Subtropical Do Atlântico Sul”. “É um sistema que fica sobre o Oceano Atlântico. No inverno, ele avança sobre o continente e vai estar numa altura de 5km. Ele assopra um vento seco de cima pra baixo. Por conta desse sistema, de maio a setembro não chove aqui”, explica Rodrigo. “Com esse vento de cima pra baixo, não é possível a formação de nuvens, porque para formar a nuvem o vento tem que ser de baixo pra cima”.
 
Neste período, o único momento em que é possível chover é quando entra uma frente fria, já que ela traz vento, e joga a fumaça para o norte. Quando as frentes frias chegam, elas consequentemente aumentam a umidade do ar, mas, depois que vão embora, logo atrás chega mais ar seco, voltando ao mesmo estado de antes. “Então é um alívio de dois, três dias, mas depois volta a ter seca”. A chegada da frente fria pode, inclusive, ajudar a dissipar as queimadas, como aconteceu em 2019 com o fogo no Parque Nacional de Chapada dos Guimarães.
 
Sem fogo

 
Apesar de todos os fenômenos explicarem o calor, a seca e o ‘aprisonamento’ da fumaça, Rodrigo explica que o principal fator é humano. “Infelizmente o povo não entende que não pode queimar. Mudança climática é uma coisa, o povo colocar fogo é outra”.
 
Além disso, o professor afirma que o chamado ‘fogo espontâneo’ é muito raro, e que na área urbana de Cuiabá praticamente todos os focos tem causa humana. “O ideal, antes de a gente pensar no tempo, é pensar no que a gente pode fazer. A primeira coisa é deixar de queimar! Se você deixa de injetar fumaça o ar fica melhor, depois de um tempo as partículas maiores da fumaça assentam. Mas se todo dia você queima, você esta alimentando a atmosfera com fumaça, ai ela não da conta de fazer isso”.