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Sábado, 27 de julho de 2024

Notícias | Economia

Especialista defende tese de que não há crise no Brasil

Na contramão da maioria dos economistas, o consultor de empresas e conferencista Stephen Kanitz defende a singular tese de que não há crise no Brasil.


Mestre em Administração de Empresas pela Harvard University, doutor em Ciências Contábeis pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, ex-professor titular da mesma faculdade e autor de vários livros sobre economia, Kanitz afirma que o Brasil tem "problemas", mas não está "em crise".

Ele desenvolveu o ponto de vista na última terça-feira (10), no programa "Entre Aspas", conduzido pela jornalista Monica Waldvogel, na Globo News.

Em entrevista ao G1, Kanitz afirmou que anos de inflação “galopante” ajudaram o Brasil a aprender a lidar com situação adversas. Estados Unidos e Europa, segundo ele, não têm a mesma experiência e por isso sofrem mais no atual cenário global. 

G1 - O Brasil não vive mais uma crise?
Stephen Kanitz - Acho que agora o termo crise seria forte demais para definir o que nós estamos passando. O Brasil não tem problemas com bancos, não tem problemas com ‘subprime’, e acabamos só tendo um problema sério no setor automobilístico em parte por um pânico de algumas pessoas que diziam que a crise realmente viria.

A notícia que eu acho que é importante é que em janeiro o setor automobilístico cresceu 92% em um único mês, o que é absolutamente fantástico. É óbvio que eu sei que o crescimento é forte porque havia uma queda no mês anterior. Mas a notícia aqui é uma recuperação fantástica, e janeiro, tipicamente, não é um bom mês no Brasil. O Brasil só começa a funcionar depois do carnaval.

Então eu acho que claramente usar o termo crise daqui para a frente é uma certa irresponsabilidade. Se você quiser dizer que nós temos problemas, se quiser dizer que temos alguns problemas sérios, eu vou discordar porque nossos problemas são bem localizados e sabemos como lidar.

G1 - Que vantagens o Brasil tem em relação a outros países?
Kanitz - Um problema que você conhece é metade do caminho andado. O problema é que os Estados Unidos não sabem o tamanho dos problemas deles. Eles fazem um pacote atrás do outro porque eles até agora não sabem a extensão do problema. Ficam sabendo que o problema é maior e aí fazem um pacote maior. Isso sim é crise. E eles estão em total desconhecimento.

Parte da capacidade do Brasil de identificar problemas rapidamente vem, por incrível que pareça, da inflação. A inflação obrigava que as empresas tivessem contabilidade diária. Cada minuto, às vezes, era contabilizado porque a inflação era galopante e a gente tinha que estar com a contabilidade em dia. Isso nos permite saber o tamanho dos problemas e ter a solução de acordo.

Não é a China que vai salvar o mundo. É o Brasil, que vai mostrar ao mundo – “este está saindo”. Vai ser um alento mostrar para o resto do mundo saber que tem um país saindo da crise muito antes dos outros.

G1 - O sr. acha que o Brasil pode conseguir, de fato, chamar a atenção de outros países?
Kanitz - É, eu acho que isso já está acontecendo. Eu sei, mas eu não posso revelar [quem], que já há oficiais americanos que ligam para o pessoal no Brasil para saber. Você não faz uma contabilidade nos Estados Unidos de um minuto para o outro.

No Brasil você faz uma transferência, você faz um TED [Transferência Eletrônica Disponível] em um segundo. Por causa da inflação. Nos EUA, dura duas semanas. Então, tem bancos americanos que não sabem nem realmente quanto eu tenho a receber porque parte do dinheiro que eu tenho a receber deles está lá entupido em uma ‘pipeline’ (oleoduto, cano, em inglês). Não são soluções instantâneas.

G1 - O protecionismo é necessário para o Brasil?
Kanitz - Não podemos ser protecionistas, precisamos de Justiça. Ninguém vai ficar brincando agora conosco só porque fizemos a nossa lição de casa e os outros países que não fizeram quererem agora vender a preço de banana. Isso desorganizaria inclusive a nossa indústria, quer dizer, a indústria que está dando certo no Brasil. Eu estou defendendo aqui não o protecionismo, mas uma justiça, vamos ser corretos. 

O Brasil não está preparado para isso [para adotar medidas protecionistas] porque as empresas brasileiras, lamentavelmente, não fazem esses esforços de proteção alfandegárias. Só depois do problema, depois de os chineses exportarem a preço de banana é que elas tendem a reagir. Eu acho que agora o Brasil precisa se antecipar e já se preparar para eventuais demandas que vão surgir. Tem que ser um pouco mais esperto.

Tem barreiras não só de preços, mas barreiras sanitárias, barreiras técnicas. É um jogo de cintura, tem que fazer isso bem feito. E o Itamaraty, sozinho, não vai dar conta, não estava preparado para essa crise, que não foi tão anunciada assim. Temos que proteger a nossa indústria nacional contra uma situação americana e européia que não é normal.

G1 - Se não há crise, quais problemas o sr. identifica no Brasil?
Kanitz - Um problema que não é nosso é justamente o setor de exportação. Eles [outros países] estão em crise. Mas não vamos dizer que estamos em crise por causa disso. A crise sempre é deles.

Menos pessoas foram viajar para o exterior. Mas mais pessoas viajaram internamente [no Brasil]. Então, houve um aumento de 9% da aviação interna e menos 7% da aviação externa.
Está aí um problema que se resolveu: transportamos mais gente internamente e o brasileiro gastou mais dinheiro no Brasil em vez de gastar dinheiro aumentando o PIB francês e alemão. Isso só vai aparecer no final do ano. Esse aumento do PIB porque mais pessoas gastaram dinheiro em turismo nacional é algo que vamos noticiar só em dezembro, quando tivermos os números do PIB.

G1 - O sr. acha que o mundo tem essa noção de que o Brasil está bem?
Kanitz - Não, claro que não. Eu não sou uma Poliana. O que eu falo é que a palavra crise foi mal colocada. Eu ouço essa palavra crise há cem dias sem parar, estou contando o número de dias que eu vejo a palavra crise no jornal. As manchetes são negativas, mas dentro dos cadernos [de economia] sempre há boas notícias.
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