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Quinta-feira, 09 de maio de 2024

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Vídeos de fãs transformam YouTube em ator na Broadway

Houve uma época, não muito tempo atrás, em que se uma diva da Broadway - por exemplo, Carol Channing ou Patti LuPone - quisesse assistir a outra pessoa interpretando sua canção marca registrada, com seu estilo característico, ela precisaria sair do camarim e encontrar um show de drags.


Agora, ela precisa apenas ligar o computador e se acomodar naquele bar musical 24 horas conhecido como YouTube. Lá, de frente para suas próprias câmeras (normalmente em seus próprios quartos), pode-se descobrir pretensas Carols, Pattis, Bernadettes e Idinas de todas as idades e sexos cantando (ou fingindo cantar) em suas nuvens privadas de narcisismo, para o deleite do público geral.

É claro, esses exibicionistas dedicados não surgiram para ficar confinados exclusivamente às pequenas telas de laptops e iPhones. Nesta temporada, alguns poucos escolhidos estão preparando - glup! - sua estreia na Broadway.

Sim, em mais uma estranha movimentação na evolução entre a velha e venerável Broadway e as novas tecnologias, o YouTube se tornou um ator coadjuvante em dois espetáculos recém-estreados (ambos, produções da Roundabout Theater Company): Everyday Rapture (no American Airlines Theater) e Sondheim on Sondheim (no Studio 54).

Em Sondheim on Sondheim - uma homenagem multimídia a Stephen Sondheim que mistura performances ao vivo, entrevistas filmadas com o compositor e uma variedade de videoclipes -, um dos destaques é a montagem magistral do YouTube com diferentes pessoas cantando Send In the Clowns. Os vocalistas no vídeo incluem Sinatra, Streisand e LaBelle. Mas o trecho que particularmente atrai a atenção (e encerra a sequência) acaba sendo um vídeo caseiro de uma pré-adolescente que obviamente dedicou muito tempo à sua apresentação.

Pesquise você mesmo no YouTube e encontrará muitas outras interpretações amadoras de Send In the Clowns ou Johanna, a determinada canção de amor do musical Sweeney Todd, ou mesmo a exigente Epiphany, todas obras de Sondheim.

Esses números são normalmente apresentados com solene autoconsciência, diferente de interpretações vigorosas da igualmente popular Poor Unfortunate Souls (o hino de malícia da malvada bruxa do mar de A Pequena Sereia), que parecem explorar o lado feminino de qualquer um, independente do sexo. O mesmo ocorre com músicas carimbadas pelo estilo de LuPone, uma atriz que inspira imitações localizadas entre a homenagem reverente e a paródia violenta.

Com frequência, essas versões trazem à mente pessoas que passam festas inteiras ao lado do piano com um ar de determinação tímida e concentrada. São aquelas que, à medida que a coragem acompanha o consumo de drinques, de repente disparam um alarmante Everything Coming Up Roses e esvaziam a sala, deixando apenas alguns poucos espíritos afins. Essa gente não é companhia confortável.

Enquanto assistimos a seus colegas no YouTube, percebemos que nossos olhos fervorosamente vasculham os frames da câmera em busca de detalhes de suas vidas. (É uma lata de desodorizante sobre a cômoda? Olhe aqueles cabides de plástico verde no armário aberto.)

Mas existe algo tocante - e até encorajador - em escutar versões sucessivas de um número da Broadway por essas autointituladas lendas. Lembramos quão pessoal é a relação de um indivíduo com a melodia de um show, muitas vezes uma intimidade tão crítica que sua exposição pública provoca tanto repúdio quanto fascínio.

Esse tipo de exposição aparece memoravelmente em Everyday Rapture. Tão fascinante quanto a compilação do YouTube em Sondheim on Sondheim ao traçar as muitas vidas de uma única canção na internet, Everyday Rapture nos leva a um novo nível de surrealismo de identidades sobrepostas. Uma quase memória de Sherie Rene Scott, que se descreve como uma "semi, semi, semiestrela", o espetáculo mostra quando a heroína do show (interpretada por Scott, é claro) descobre que tem um fã no YouTube, alguém com quem, de certa forma, ela se identifica.

Com o nome de perfil Broadwayislove09, ele tem 15 anos e finge cantar uma gravação que Scott fez de My Strongest Suit (de um de seus quase sucessos da Broadway, Aida), usando uma variedade de coreografias com a qual Lady Gaga poderia aprender.

Sherie entra em contato com esse rapaz aparentemente fissurado nela e imagina que ele seja um desajustado na escola, como ela era na idade dele, quando cantava para seu reflexo na bandeja. Mas Broadwayislove09 (interpretado por Eamon Foley com uma auto-obsessão deliciosa e raivosa) segue a lógica da realidade virtual, na qual não se pode confiar na identidade de ninguém. Isso leva a uma troca cada vez mais bizarra de e-mails entre Sherie e seu imitador, que a faz afirmar "Eu sou eu" numa voz frágil e insegura de si.

É um encontro de comédia musical e Matrix.

O grandioso dessa cena, a partir da perspectiva de um amante do teatro, é como a situação traduz um miniciberdrama em termos completamente teatrais.(Broadwayislove09 aparece numa tela de computador fictícia que se parece com o velho palco de marionetes de Punch and Judy.) Eu mencionei que o número musical da sequência - ao lado de My Strongest Suit - é Killing Me Softly With His Song?

O espetáculo se reapropria da web, de certo modo, em benefício de uma forma mais antiga de autoexpressão. Ao mesmo tempo, Everyday Rapture é uma das primeiras peças do teatro comercial a sugerir como as regras do jogo estão mudando para o estrelato e a música da Broadway.

O salão de espelhos que se tornaram os musicais da Broadway nos anos recentes - com referências, citações, brincadeiras e homenagens internas - adquire um novo tipo de imagem que pode muito bem se refletir infinitamente.

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