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Quinta-feira, 02 de maio de 2024

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Felippy Damian endossa manifesto: Escritores do Brasil, escrevam também para o Cinema!

Oportunamente revi no dia 25 de julho, Dia do Escritor, o filme Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, direção assinada por Beto Brant e Renato Ciasca e lançado em 2012. O meu oportunismo se deve ao fato do responsável pelo roteiro do longa, Marçal Aquino, não se definir enquanto roteirista, mas sim como um escritor que também escreve para o cinema, afirmação feita pelo autor no Sala de Cinema, programa do SESCTV.

O roteiro se baseia no romance homônimo de Aquino, assim como boa parte da longa parceria entre ele e Brant. É a virtude maior do ótimo filme, que conta com atuações contundentes do trio de protagonistas Camila Pitanga, Gustavo Machado e Zecarlos Machado e fotografias interessantes, quase hedonistas.

Vemos a história do fotografo Caubi (Gustavo Machado), que se apaixona pela beleza estonteante de Lavínia (Camila Pitanga), esposa do Pastor Hernani (Zecarlos Machado), líder de uma curiosa organização religiosa. É por meio dos olhares de Caubi que a fotografia do filme se torna tão bela. Ele, um amante do belo, se vê extasiado e também extasia quem vê pelos seus olhos ao fotografar a nudez de uma personagem desconhecida logo na cena de abertura do filme e posteriormente, a beleza desnudada de Lavínia e seus lindos lábios, que darão nome ao romance e filme. Tudo isto ambientado no interior do Pará, na inspiradora floresta amazônica.




Lavínia é o personagem mais complexo e volátil nesta obra. Sempre revezando sua aparência e estado de espírito entre o desejável e o repugnante. Confesso ter me incomodado com a atuação de Camila Pitanga no começo do longa, entendendo a seguir que não havia tempo suficiente para toda real e total apresentação de seu personagem, que lhe exigiu interpretação mais eloquente que as telenovelas brasileiras a fazem.

Deve se enganar quem imaginar o Pastor Hernani como um papel frágil e estereotipado. É praticamente impossível identificar a que tipo de igreja ou organização religiosa ele pertence e exerce liderança naquela pequena cidade. Suas pregações carregadas de misticismo e incitações sociais são baseadas nos livros mais abundantes de signos da bíblia, o Gênesis e o Apocalipse. Será o pastor o responsável pela reabilitação de Lavínia que o retribui nutrindo por ele sentimentos mais singelos ligados à gratidão, admiração e proteção. É justamente com os três personagens que acontece a cena mais bonita e comovente do longa-metragem.

Na distinção entre os dois amores é que a direção consegue imprimir seu feeling. Nas cenas de sexo principalmente, fica bem evidente a diferença de forma, não de intensidade, como afirma Lavínia em resposta a Caubi. Talvez fosse mais interessante para os diretores se conseguissem utilizar melhor os cenários da Amazônia, organizando planos que contribuíssem esteticamente e narrativamente para obra, além dos gastos planos de transição feitos por tomadas aéreas. Terrence Malick é instantâneo quando tenta-se lembrar de um diretor que realize algo parecido com notável maestria.

A importância maiúscula de Marçal Aquino em Eu receberia as piores notícias dos seus lindo lábios, diante de tantos roteiros médios na indústria audiovisual, é argumento definitivo para que este escritor de coluna recorde e também parafraseie uma chamada mais famosa de um manifesto bem maior: Escritores do Brasil, escrevam também para o cinema.


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