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Terça-feira, 23 de julho de 2024

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Para réu, coronel acusado de massacre do Carandiru é "ídolo"

O coronel Valter Alves de Mendonça afirmou durante o seu depoimento que um dos réus no processo do massacre do Carandiru, o também coronel Luiz Nakaharada, é “um dos [seus] maiores ídolos”. A afirmação do réu causou surpresa até mesmo nos promotores.


Nakaharada era do 3° Batalhão de Choque em 1992 e o oficial mais graduado depois do coronel Ubiratan Guimarães.

Mendonça disse não conhecer também qualquer planejamento para rebeliões, um deles intitulado “Plano Carandiru”, outro conhecido como “Plano Boreal”, ou qualquer outra denominação, defendendo que, embora sempre existissem conversas, nunca foi montado um plano específico para conter um motim de grandes proporções na Casa de Detenção.

— Havia um plano de ação e ele foi definido no gabinete do diretor do presídio. Não tive conhecimento de nenhum outro antes desse. A gente define essas coisas na hora da ação.

Defesa apresenta escudo com marcas como prova

A advogada Ieda Ribeiro de Souza apresentou fotos de escudos com marcas de bala para comprovar que os policiais foram sim recebidos a bala durante a invasão ao terceiro pavimento. A versão, não embasada pelo depoimento do perito criminal Osvaldo Negrini Neto no primeiro dia de julgamento, contou ainda com uma exibição em 3D aos jurados.

A defensora considerou ainda perfeitamente normal o coronel não se recordar de detalhes de um fato ocorrido há mais de 20 anos. O próprio Mendonça definiu qual era o seu foco durante a invasão.

— O meu foco principal era minha proteção, da minha vida, e domínio do local onde eu ia entrar.

O coronel da PM ainda disse não entender a razão de que seja atribuída a ele e sua equipe da Rota tantas mortes. Ele comentou que muitos corpos foram levados para o terceiro pavimento, até que uma ordem, a quem ele não atribuiu origem, fez com que a movimentação dos corpos fosse paralisada.

— Muitos corpos foram movimentados, levados para baixo, mas então foi passada a ordem para parar tudo. Foi ordem que pessoal da Rota recebeu. Pela informação que recebi, parou no meu andar.

Por fim, antes de um breve desabafo em que lembrou até mesmo da mãe, que não queria que ele fosse policial, o coronel afirmou que ainda duvida do número de mortes atribuídas aos policiais no massacre.

— Já mudaram tanto o número de mortos, o número por andar, já mudaram tantas vezes... Nem eu sei quantos mortos são.

Tensão e mais contradições

O testemunho também foi marcado por contradições e momentos de tensão. O primeiro foi quando o coronel disse que o plano inicial, que previa que a Rota fosse a última tropa da PM a entrar no pavilhão, foi modificado momentos antes do início da operação de invasão.

— O coronel Ubiratan [Guimarães, responsável pela operação] nos reuniu para definir uma estratégia de entrada. Primeiro entraria o 2º Batalhão do Choque a frente, com escudeiros e efetivo da Rocam, uns 130 oficiais. Na sequência, entraria o 3º Batalhão do Choque, com escudeiros e caminhão. Depois vinham dois grupos pequenos do COE e do Gate, conduzidos pelo Capitão Salgado e Mascarenhas, e a tropa da Rota ficaria por último. Depois que o portão foi estourado, o coronel Ubiratan, acompanhado de dois juízes e outras autoridades, inverteram a ordem de entrada, conosco indo primeiro.

Em dois momentos, Mendonça se contradisse. Em pergunta feita pelo juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, ele afirmou que, pela Rota, ele não tinha experiência em invasões a presídios, apenas em “cadeias distritais”. Mais adiante, confrontado pela promotoria, o coronel destacou já ter debelado uma rebelião no Carandiru, “em 1981 ou 1982”, em uma situação que envolvia reféns e teve mortes.

As primeiras equipes da Rota a entrarem no Pavilhão 9 encontraram alguns presos, que foram reunidos no meio do pátio, e “quatro corpos, um deles sem cabeça”, de acordo com o testemunho de Mendonça. Após um preso indicar a entrada e as escadas, os policiais encontraram barricadas, fumaça e “mais dois corpos”. A tropa então subiu, “em meio a muito óleo avermelhado”, segundo palavras do coronel, quando teriam ocorrido os confrontos.

— As sete equipes comandadas pelo capitão Ronaldo [Ribeiro dos Santos] ficaram no primeiro andar [segundo pavimento] . Eu subi com a minha equipe e fomos progredindo. Aos primeiros passos do segundo andar [terceiro pavimento], vi clarões e estampidos em minha direção. Alguns atingiram o meu escudo. Revidamos e gritamos para que todos entrassem nas celas. Seguimos avançando e encontramos presos gemendo de dor. Os disparos recomeçaram e alguns presos deixaram suas celas para nos agredir. Eu mesmo fui agredido com um estilete e uma porretada na perna. Fomos até o final do corredor e dominamos a situação ali.

Mendonça garante que todos os feridos, incluindo os policiais, foram socorridos. Ele deixou o pavilhão nove em seguida, foi medicado e foi orientado por um colega a não retornar, por “ordens superiores”.

O coronel afirmou ainda que “duas a três armas” foram recolhidas nas celas, as quais estando com os detentos, e que elas foram disponibilizadas no batalhão.
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