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Quarta-feira, 26 de junho de 2024

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Especialistas: momento não é propício para eleições no Haiti

Especialistas engajados nas missões brasileiras no Haiti acreditam que o momento vivido pelo país, devastado por um terremoto em janeiro e sofrendo com uma epidemia de cólera que já matou mais de 1,6 mil, não é bom para a realização de um processo eleitoral. Ainda assim, eles concordam que a importância de escolher o novo presidente o mais rápido possível é de extrema importância para manter a soberania do país.


Neste domingo, mais de 4,6 milhões de haitianos deverão comparecer nos 11.181 colégios eleitorais para eleger um dos 18 candidatos como o novo presidente da nação, além de 11 dos 30 senadores e 99 deputados. O eleito substituirá René Préval, do Partido Lespwa, no mandato desde maio de 2006.

Para Ricardo Seitenfus, representante especial da secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) e presente em solo haitiano para acompanhar a missão internacional, o momento não é propício, muito menos adequado para a realização de uma eleição. "As dificuldades de logística, infra-estrutura, transportes, comunicação e mobilização são reais para um país que sofreu uma grande catástrofe", afirmou ele ao Terra. No entanto, destacou Seitenfus, é preciso continuar avançando e realizar uma eleição de forma legítima. "A legitimidade do voto do povo é fundamental para reconstrução do país", disse.

Além da cólera, a possibilidade de fraudes também contribuem para um clima de tensão. A ONU garante que, apesar dos problemas, o pleito será realizado sem interrupções, pois o governo e a imensa maioria dos candidatos estão determinados a garantir sua realização. "O sistema eleitoral haitiano possui dificuldades históricas. Há sempre esse risco, caso o processo não seja controlado e observado", afirmou Seitenfus.

Na opinião de Giancarlo Summa, diretor do Centro de Informações da ONU no Brasil, o risco sempre existe, mas ele não acredita que as eleições serão marcadas por alterações ilícitas. "A ONU está empenhada em ajudar o processo. Quanto maior a presença internacional neste momento, menos se torna possível essa possibilidade", disse. Ele acrescentou que as Nações Unidas "estão vigilantes para que fraudes não aconteçam".

Summa também tem plenas convicções que a epidemia de cólera não vai atrapalhar o andamento do processo. "Não inviabiliza o processo eleitoral. É só um problema sério a mais que os haitianos enfrentarão", afirmou. "Na avaliação do Haiti como um todo, é fundamental que as eleições sejam realizadas o mais rápido possível. O encarregado de encaminhar a reconstrução é o governo do país", acrescentou.

O especialista destacou que, mesmo com a miséria, o Haiti tem uma atividade política e social "dinâmica e intensa". Por isso, ele avalia que a missão das forças de segurança da ONU está chegando ao fim. "Não é um protetorado, é um país soberano que precisa de um presidente", afirmou. O que fazer daqui para frente, ressalta Summa, "cabe ao governo haitiano, e não às Nações Unidas".

Ao lado do descrédito da população em que o novo presidente consiga liderar a reconstrução da nação, ainda há a dúvida se a participação dos eleitores será satisfatória. "Do ponto de vista técnico, temos todas as garantias de que as eleições funcionem. A dúvida mesmo é sobre a participação do povo", salientou Seitenfus.

"É evidente que um país traumatizado, extremamente pobre, com parte da população vivendo na miséria, gera preocupação em relação ao pleito, mas tivemos uma grande procura nos últimos meses pelas cédulas de identidade", acrescentou. Nos últimos dias, foram entregues mais 340 mil novas cédulas.

Frustração popular
A frustração e a insatisfação popular são outros dos problemas que podem atrapalhar as eleições do próximo domingo. O sentimento do povo é facilmente observado através dos protestos tanto contra as forças de segurança da ONU, quanto entre os simpatizantes dos principais candidatos da corrida eleitoral. Na última segunda, duas pessoas foram assassinadas e várias ficaram feridas por disparos após confrontos entre pessoas que seriam partidárias do candidato Jude Célestin, do partido Inite, ligado ao poder, e de Charles-Henri Baker, do partido Respe.

"Nós podemos entender a frustração e a insatisfação do povo. Muitas promessas foram feitas e a ajuda internacional só entregou metade do prometido", afirmou Giancarlo Summa. Segundo ele, dos US$ 2,12 bilhões prometidos para 2010, apenas US$ 897 milhões foram entregues - cerca de 42,3% do total. "Chegou muito menos ajuda do que havia sido prometido", completou.

Seitenfus considera normal a frustração da opinião pública e a ideia de que não haverá uma salvação política em meio a problemas tão graves. "Há uma grande movimentação na televisão e nas rádios e os políticos não estão bem cotados sob o ponto de vista da sociedade. Mas isso é normal, tendo em vista as decepções políticas que o Haiti sofreu", completou.

Violência condenável
Especialistas na questão Haiti, Ricardo Seitenfus e Giancarlo Summa, também condenaram os protestos da população contra os soldados nepaleses da ONU, que deixaram três mortes e mais de 30 feridos em Cap-Haïtien esta semana. Centenas de manifestantes acusaram os capacetes azuis nepaleses de ter originado a epidemia ao despejar material fecal em um rio que atravessa o departamento de Artibonite, onde o surto começou. No entanto, os exames feitos nos soldados asiáticos tiveram resultado negativo.

"A essa altura não adianta saber de onde veio a cólera, não tem mais importância. A violência acaba só piorando a situação", afirmou Summa. Segundo ele, ações mais agressivas fazem parte do clima de tensão e frustração que a população vive. Summa informou que a ONU não tem pretensão de ficar no país por tempo indeterminado. "Se a ONU fosse embora do território hoje, seria pior para os haitianos. A missão não é perfeita, mas é muito útil", explicou.

Para Seitenfus, a situação atual é pior do que a encontrada em 2004 (quando houve o golpe de Estado contra o presidente Jean-Bertrand Aristide). "Existem dúvidas sobre a presença da Minustah (Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti), mas o povo precisa entender que o maior inimigo hoje não é militar, e sim a miséria. Esse é o desafio a se combater", disse.
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