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Quinta-feira, 03 de outubro de 2024

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Iraque sonha em ressuscitar suas ricas tamareiras

Árvore mítica, já celebrada pelos babilônios por sua prodigalidade e majestade, a tamareira pagou um pesado tributo às sanções e às guerras no Iraque desde 1980, mas as autoridades decidiram voltar a aprumar este símbolo de uma cultura milenar.


Três guerras e doze anos de um drástico 'embargo internacional puseram de joelhos a indústria iraquiana de tâmaras que um dia, com mais de 600 espécies diferentes, ocupava o primeiro lugar mundial, desde a década de 1950.

"Nos tempos antigos, as pessoas dependiam muito desta árvore", de onde tiravam os alimentos, além de móveis e cestos, destaca Kamel al-Dulayme, diretor do Departamento de Tamareiras do Ministério da Agricultura, na liderança de um programa destinado a plantar milhões de árvores.

"A palmeira tem muito em comum com o homem. É a única árvore que morre se uma pessoa corta sua cabeça. Sua silhueta também é parecida. É um símbolo por todas essas razões", destaca.

Além disso, a tamareira é a árvore mais popular do país e fazê-la reviver reveste a construção de um novo Iraque de um sabor de parábola, admite o funcionário. A estrada que liga Bagdá a seu aeroporto, que ficou tristemente célebre por seus inúmeros atentados, é também local onde serão replantadas, por quilômetros.

O objetivo é quase triplicar o número de tamareiras, de modo a chegarem a 40 milhões, em 2021. O projeto, que visa, também, lutar contra a desertificação, é "uma prioridade", sendo dotado de orçamento de 180 bilhões de dinares (108 milhões de euros) para o período 2005-2021, explica Dulayme.

O ministério criou mais de 30 viveiros dessas jovens palmeiras e trabalha com investidores privados num projeto de plantação nos grandes desertos do oeste do país, irrigados graças a lençóis d'água subterrâneos. Milhares de jovens plantas foram também oferecidas pela FAO e os Emirados Árabes Unidos.

Mas a tarefa parece titânica. O número de árvores, estimado em 32 milhões nos anos 1960-70, teve uma redução de 12 milhões, em 2000. Atualmente, não está disponível nenhuma cifra mais recente.

Basra (sul, uma região fértil antigamente, foi a mais atingida, com apenas 2 milhões de árvores sobreviventes. Na periferia da cidade o "deserto de palmeiras" se estende, hoje, por quilômetros, num imenso espaço árido coberto de velhos troncos - uma consequência da guerra Irã-Iraque, de 1980-88.

O embargo dos anos 1991-2003 privou, em seguida, os camponeses de material agrícola e a água se rarefez, na medida em que barragens iam sendo construídas na Turquia e no Irã.

A invasão americana de 2003 favoreceu, indiretamente, a proliferação de doenças e de pragas, e todos os aviões de fumigação ficaram no solo por mais de dois anos.

Um grande número de plantações também desapareceu. Nas árvores que permaneceram, os frutos não têm a mesma qualidade, além de terem se ressentido, explica Nour Abbas Hachem, um produtor de Basra. "Produzíamos toneladas, agora são apenas algumas dezenas de quilos", lamenta ele.

Mizher Adai, 45 anos, perdeu um terço de suas 250 palmeiras. Sua plantação foi vítima diretamente da violência religiosa de 2007-2008, quando milicinos xiitas e sunitas enfrentavam soldados americanos em seu bairro particularmente perigoso de Bagdá.

"Todos os problemas vêm dos ocupantes (americanos). Eles não apenas mataram os homens, mas são a causa da morte das árvores", acusa ele.

Toda a palmeira atingida por uma bala ou um morteiro fica condenada, morrendo nos três anos seguintes, explica, apontando várias árvores em agonia e dezenas de tristes troncos decapitados.

Uma delas foi pulverizada por um foguete Katiushka. Mas Adai não se queixa diretamente disto, porque a árvore salvou a vida de sua família, protegendo a casa a dois metros dali.

"Preciso de ajuda financeira para renovar minhas tamareiras e não tenho meios. Estamos tristes porque essas árvores são muito preciosas para nós", concluiu ele.
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