Homens vestidos de mulher e publicitários vestidos de médicos misturavam-se com senhores de idade e estrangeiros que prestigiaram, na manhã deste sábado (5), sob chuva intensa, um dos blocos de rua mais tradicionais do Rio de Janeiro, o Cordão do Bola Preta, criado em 1918.
Quatro trios elétricos foram colocados na avenida Rio Branco, no Centro, e comandaram a festa ao som de marchinhas para uma multidão, que, de acordo com um agente da Polícia Militar presente no local, girou em torno de 1 milhão de pessoas.
Logo nos primeiros instantes na avenida, o presidente do Cordão do Bola Preta, Pedro Américo, que estava em cima do trio elétrico, teve que repreender um grupo fantasiado de super-heróis que exageraram na empolgação e subiram sobre um caminhão estacionado nas imediações. Interrompendo a música, ele pediu ao grupo que descesse do veículo e que respeitasse o patrimônio alheio. "Peço muita paz, tranquilidade e respeito ao patrimônio. Não façam xixi na rua. Carnaval é beijar na boca e ser feliz", afirmou ao microfone.
Tranquilidade era o que transparecia a postura de Flávio Torres, funcionário da Petrobras que há 20 anos sai no bloco. Ao som de Aurora, o folião dançava sozinho em uma das ruas que cortava a Rio Branco, afastado do cerco em volta do trio. Vestido com calça e camisa brancas, e usando um chapéu panamá, o carioca disse que prestigia diversas categorias do Carnaval popular. "Gosto de blocos de rua, mas também gosto de Carnaval da avenida, principalmente os dos grupos de acesso. É sempre muito animado", afirmou enquanto bebia uma Coca-Cola, segundo ele, "para dar uma hidratada".
Animadas também estavam as três mulheres da família Alves. As sexagenárias Suely e Janete concordaram em dizer que o Cordão do Bola Preta é o melhor bloco e que as duas saem há mais de 30 anos. "Meu pai morreu com 94 anos, e a última vez que ele veio, tinha 90. O melhor Carnaval sempre foi o de rua", disse Suely, que se protegia ao lado da sobrinha, Isabela, sob um toldo na calçada.
Com muita energia já nos primeiros instantes do desfile, quinze amigos lutadores de kickbox da Vila da Penha, no Rio, usavam perucas cor-de-rosa e roupas do super-herói criado pelo grupo especialmente para participar do bloco neste ano: o batgay. José Luiz Perri, 46, contou que os foliões sempre criam fantasias de personagens femininos para sair no Bola Preta e em outros blocos tradicionais da folia carioca, como a Banda de Ipanema e o Bloco das Piranhas. "O Carnaval do Rio é na rua", disse.
Mais adiante na multidão, um "médico" do Bola D'or - referência a um tradicional hospital carioca - anunciava no megafone que um membro da equipe deveria comparecer com urgência à "sala de entrevistas". Apesar de a maioria não ser da área da saúde e sim da publicidade, o grupo de amigos do Rio sai há cinco anos no bloco vestido de médicos, cada um identificado com sua "especialidade": neurologista, anestesista, proctologista. "É um atendimento atrás do outro. Só não pode se apaixonar", disse um dos foliões.
No meio da multidão, uma imagem típica: com camiseta do Brasil e com a câmera fotográfica em punho, o chinês Hui Guo, que estava hospedado em Copacabana, disse que soube do bloco pelo guia da prefeitura, mas não imaginava que fosse tão lotado. "Eu vim para ver samba", afirmou entre risos.
Distante dos simpatizantes do bloco, mas animando-os do alto, estavam as atrizes Leandra Leal, porta-estandarte, e as musas Quitéria Chagas e Júlia Liers. A madrinha do Bola Preta, Maria Rita, não pôde comparecer a tempo, em virtude do atraso de seu vôo de São Paulo para o Rio.
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