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Domingo, 28 de julho de 2024

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Pacificação reduziu em média 50% dos homicídios em 38 bairros do Rio

RIO - Quase três anos após o início da implantação do projeto das Unidades de Polícia Pacificadora, os resultados da política que tem mudado o Rio são números impressionantes. Pela primeira vez, um levantamento feito pelo GLOBO revela o impacto de 17 UPPs nos indicadores de criminalidade de 38 bairros da cidade. Com base na análise das estatísticas do Instituto de Segurança Pública (ISP), é possível dizer que o fim dos tiroteios e do controle do tráfico nas favelas beneficiadas, das zonas Sul, Norte e Oeste, representaram uma queda média de 50% no total de homicídios. Ao se reduzir o número de mortes, cerca de 270 vidas foram salvas nesse período: se fosse uma, já valeria a pena, mas esse total representa mais do que se mata em dois meses na cidade. Roubos, foram menos 11 mil.


Para chegar aos valores médios, os dados foram examinados em blocos, já que as unidades foram inauguradas em anos diferentes. Nas delegacias que ficam nas áreas de influência das quatro primeiras UPPs (Dona Marta, Pavão-Pavãozinho/Cantagalo, Cidade de Deus e Batam), os assassinatos caíram pela metade: de 216 em 2008 para 114 em 2010, uma redução de 47%. Os latrocínios caíram 40%; os roubos de veículos, 46%; assaltos a lojas, 21%; a residências, 38%; a bancos, 86%; a coletivos, 27%; e a transeuntes, 21%.

Para Beltrame, é preciso ter calma

Num segundo bloco, das UPPs de 2010 (Turano, Providência, Borel, Formiga, Salgueiro, Andaraí e Tabajaras), também se observa uma queda considerável da maioria dos crimes. Nessa área, os homicídios caíram 62% (de 84 para 32), quando se comparam os primeiros seis meses de 2009, ano anterior à implantação das unidades, com o mesmo período deste ano. Os latrocínios passaram de 117 para 51 (menos 56%). Já os roubos a lojas caíram 39% e a residências, 74%.

Como as três UPPs de 2011 são muito recentes (Coroa-Fallet-Fogueteiro, Escondidinho-Prazeres, São João-Matriz-Quieto), só os dados de homicídios e roubos deste ano foram usados. Uma análise mais detalhada só será possível em alguns meses. A UPP da Mangueira ficou de fora porque só foi inaugurada este mês.
Os desafios são enormes. Mas, depois de um sentimento inicial de desconfiança, a moradora “desde sempre” do Cantagalo Branca Alves, de 65 anos, dá sua versão divertida para a pequena revolução que está experimentando na vida:

— Sou de um tempo em que as crianças só seguiam a cabeça dos pais. Hoje, elas são como piolho: seguem a cabeça que passa — diz Branca, fazendo uma metáfora sobre a má influência que os traficantes exerciam sobre as crianças do morro. — Meus netos não vão precisar ver o que eu vi: armas, drogas e cabeças cortadas.

Avesso ao discurso do “já ganhou”, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, procura manter o foco no que ainda precisa ser feito. A quem pergunta por que ele mostra pouco entusiasmo, responde que é preciso ter calma. Mas Beltrame sabe que os avanços obtidos já converteram antigos críticos em parceiros. E joga para frente: sem a presença do estado, as UPPs de nada adiantariam:

— As pessoas têm que sentir objetivamente que vale a pena estar do lado do Estado e não do lado do tráfico. Não pode ter lixo na porta de casa. Elas precisam se sentir valorizadas, não só pela presença da polícia, mas através da chegada de escolas, de luz, de água.

Nos seus planos, uma ambição, ainda longe de ser concretizada: a retirada dos fuzis dos policiais nas UPPs:

— Se eu estou fazendo uma luta contra o fuzil, por que vou me apresentar de fuzil? Mas não posso fazer isso de uma hora para outra.

Perguntado sobre quantas pessoas já teriam sido libertadas do jugo do tráfico, ele arrisca um contingente do tamanho de duas Niteróis:

— Acho que nós já temos aí perto de um milhão de pessoas livres.

Com a ocupação de territórios antes entregues ao tráfico, as UPPs provocaram mudanças de comportamento. Dados do Disque-Denúncia (2253-1177) mostram que houve uma brusca alteração no ranking de preocupações dos moradores dessas comunidades. Em vez da violência de traficantes, os denunciantes ligam para reclamar do lixo e do barulho. No Cantagalo, Eunice Silva Costa diz que não vai mais pagar a conta de luz, que pulou para R$ 50.

— Podem cortar, não tenho condições de pagar — admite ela um problema vivido por muitos outros que antes tinham “gato” de luz.

Porém, um item novo e preocupante entrou na lista: abusos praticados por PMs das UPPs.

Uma das favelas mais violentas da região da Tijuca, o Borel coleciona relatos anônimos de agressões cometidas por policiais. Durante uma visita do GLOBO, moradores disseram ter medo de formalizar denúncias.

— Vi um rapaz de 17 anos ser parado quando subia o morro para uma “dura”. Antes de ver se ele tinha droga ou arma, o policial bateu muito no rosto dele — conta uma mulher.

Moradores ainda relatam abusos

Num beco e outro, ouvem-se histórias de abusos. Uma das guarnições que atuam no morro usaria até pedaços de pau para espancar aqueles que não seguem à risca as novas regras. A relação entre morador e policial é delicada. Depois de voltar de um show, X., que tinha bebido, esbarrou num PM da UPP:

— Só por isso, ele colocou a pistola na minha cabeça.

Apesar disso, algumas pesquisas mostram avanços. O Instituto de Opinião da Fundação Getúlio Vargas (FGV) criou o Índice de Percepção da Presença do Estado, que mediu a forma como os moradores do Complexo do Alemão estão vendo as ações de órgãos públicos na comunidade. Foram feitas 400 entrevistas. De zero a 100, os entrevistados deram nota 32 para a atuação da polícia em 2009, antes da ocupação, e 57 em 2011.

— O interessante é que a nota deste ano fica muito próxima da que moradores de bairros da Zona Sul deram para o mesmo item no período — afirma o cientista político Márcio Grijó, professor do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil na FGV.

Quando perguntados se a polícia tratava bem os moradores, os entrevistados deram nota 26 em 2009 e 49 este ano. Sobre os equipamentos culturais, deram 45 em 2009 e 58 este ano. A única novidade que chegou ao local foi um cinema 3D. Além disso, 60% disseram acreditar que a vida vai melhorar muito e 16%, um pouco.

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