Ao dar posse ao novo ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, nesta quarta-feira a presidente Dilma Rousseff afirmou que a política externa brasileira não interfere na vida de outros países, depois que o diplomata brasileiro Eduardo Saboia organizou a fuga de um senador boliviano para o Brasil sem autorização oficial.
A atuação de Saboia, à revelia do Itamaraty, resultou na queda do ex-ministro das Relações Exteriores Antonio Patriota, que já acumulava um forte desgaste junto a Dilma, que considerava sua postura à frente do ministério apagada.
"Não interferimos na vida dos outros países, não colocamos a vida de quem quer que seja em risco, cidadãos brasileiros ou de qualquer nacionalidade. Adotamos rigoroso conceito de não intervenção, e só aprovamos ações excepcionais em defesa da preservação de vidas humanas se passarem pelo devido escrutínio e tiverem o amparo da ONU", discursou Dilma.
Mas coube a Patriota a crítica mais forte à atuação de Saboia, que tem comparado a situação do senador Roger Pinto, que estava há cerca de 450 dias na embaixada brasileira em La Paz depois de receber asilo do governo brasileiro, a de um preso político, o que tem irritado Dilma.
"A atuação independente do servidor em La Paz, em assunto de grande sensibilidade e sem instruções, representa conduta que não pode voltar a ocorrer. Por força do nosso trabalho a diplomacia brasileira conquistou respeitabilidade e credibilidade. Estou certo que continuará assim", discursou o ex-ministro.
"Durante o período em que o senador esteve na embaixada brasileira em La Paz, o Brasil agiu sempre em respeito à soberania boliviana sem deixar de buscar, por intermédio de mecanismo específico, solução negociada e juridicamente sólida que garantisse o trânsito seguro do senador para o território brasileiro", acrescentou.
A vinda do senador para o Brasil sem salvo-conduto do governo boliviano deve ser alvo de diálogo entre Dilma e o presidente da Bolívia, Evo Morales, nos próximos dias, já que o país vizinho está cobrando explicações do Brasil.
Na terça-feira, havia expectativa que ela telefonasse para Morales antes mesmo da reunião de cúpula da Unasul, no Suriname, na próxima sexta-feira.
O assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, disse à Reuters que conversou com o vice-presidente boliviano, Álvaro García Linera. Ele acredita que o episódio não vai causar problemas na relação entre os dois países.
O senador boliviano já pediu refúgio ao Brasil, que será analisado pelo Conselho Nacional para os Refugiados (Conare).
Durante a cerimônia nesta quarta, Dilma usou o discurso para afagar o país vizinho tentando minimizar a polêmica.
"O alicerce de nossa política externa é a relação harmônica e respeitosa com nossos irmãos latino-americanos. A eles sempre devemos dar o melhor de nós. A maior de nossas prioridades é a integração regional, principalmente com nossos vizinhos da América do Sul. Somos 12 países irmãos."
NOVO PERFIL
Com a troca na chancelaria, Dilma não pretende mudar a estratégia da política externa brasileira, mas espera uma mudança de perfil no comando do Itamaraty.
Figueiredo é tido no Palácio do Planalto como um embaixador mais incisivo na defesa dos interesses brasileiros e Dilma gostou na sua atuação durante a conferência ambiental Rio+20, sediada pelo Brasil no ano passado.
O novo chanceler é descrito por seus colegas como um negociador hábil que defendeu com vigor as posições do Brasil nos fóruns de mudança climática, como a conferência de Copenhague em 2009 (COP-15), além de ter sido um dos organizadores da Rio+20.
Uma fonte do Palácio do Planalto disse à Reuters, sob condição de anonimato, que Figueiredo "briga mais pelas coisas que a presidente ordena".
Apesar disso, Dilma elogiou a gestão de Patriota, lembrando que o Brasil chegou a postos importantes em organismos internacionais, como a presidência da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização Mundial do Comércio (OMC).