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Domingo, 21 de julho de 2024

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Morte de cinegrafista acirra debate sobre leis para protestos

Em meio à crescente pressão por uma resposta do poder público à morte do cinegrafista Santiago Andrade, aumentam também as preocupações de que novas — e duras — leis acabem inibindo direitos democráticos de manifestações populares.


De um lado, alguns políticos e parte da população pressionam por punições mais duras a atos de violência cometidos durante protestos, argumentando que eles tiram a legitimidade dos protestos e prejudicam pessoas inocentes.

Em contrapartida, teme-se que leis ganhem contornos "oportunistas" e sirvam para desestimular protestos, num momento de grande insatisfação popular com os gastos públicos.

O debate se acirrou com o projeto de lei antiterrorismo, prestes a ser votado no Senado, que prevê punição de até 30 anos de prisão para quem "provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou privação de liberdade da pessoa".

Diversos articulistas de jornal questionaram a validade da lei. O colunista Elio Gaspari, da Folha de S. Paulo e O Globo, criticou o caráter 'vago' da redação da lei e comparou-a à de um artigo da Lei de Segurança Nacional baixado em 1969, 'no auge da ditadura'. Em capa, o jornal Correio Braziliense chamou a proposta de 'AI-5 padrão Fifa'.

Nas redes sociais, proliferam comunidades e comentários contra ou a favor do projeto, de um lado citando 'tentativas de criminalizar protestos' e, de outro, culpando black blocs pela deterioração da situação.

O senador Romero Jucá (PMDB-RR), autor do projeto, diz, porém, que é 'errada a leitura de que a lei de terrorismo servirá para impedir manifestações'. Servirá, segundo ele, para 'o país estar preparado para impedir crimes e financiamento terroristas, algo passível de acontecer no mundo inteiro'.

'As manifestações são livres, democráticas e legítimas. Quando se transformam em baderna, isso não é terrorismo', diz Jucá à BBC Brasil. 'Isso deve ser enquadrado como vandalismo, ou, em casos como o de Santiago, homicídio.'

Jucá agiliza a tramitação de um segundo projeto contra crimes de vandalismo, esse sim voltado para 'agravar as penalizações' contra danos ao patrimônio público e privado durante protestos. Segundo o senador, a meta é votar a lei de terrorismo nos próximos 15 dias e a de vandalismo até o final de março, para encaminhá-las à Câmara.

Vandalismo

Mas para o professor de direito constitucional Leonardo Vizeu, da UFRJ, projetos de lei como esses são 'casuísticos', desnecessários e podem desestimular manifestações.

"Já estão previstos no Código Penal os crimes de danos ao patrimônio e formação de quadrilha", afirma à BBC Brasil, temendo que novas leis deixem brechas para que "pessoas sejam criminalizadas por marcarem de se reunir (para protestar) e se sintam inibidas em exercer seus direitos".

Quanto ao projeto de lei antiterrorismo, Vizeu questiona o "o momento político".

— Existe, sim, o medo de que algo (ato terrorista) aconteça durante a Copa do Mundo, mas qual é a possibilidade real?

O senador Pedro Taques (PDT-MT) propôs que seja acrescido um artigo ao projeto de lei, diferenciando as manifestações dos atos de terrorismo. A emenda sugerida por Taques é de que seja explícito que 'não constitui terrorismo a conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios'.

Os secretários de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, e São Paulo, Fernando Grella Vieira, também apresentaram projetos de lei em reação à onda de protestos, endurecendo penas para crimes cometidos durante manifestações.

O professor Vizeu opina, porém, que em momentos de grande clamor público, 'é comum que embarque-se em soluções de fazer leis mais duras, sem que se consiga diminuir de fato a violência ou sem analisar suas causas - como o despreparo do Estado em fazer o controle de multidões e garantir a segurança dos manifestantes'.

Já Jucá argumenta que é preciso aumentar as penas por vandalismo porque "já não se trata mais de algo isolado ou fortuito".

— Estamos vendo que as manifestações estão servindo a outros fins. (Isso) é ruim para quem quer fazer a manifestação legítima porque, no fim do dia, os manifestantes querem que os jornais cubram suas reivindicações (em vez de cobrir apenas os atos violentos).
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