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Quinta-feira, 18 de julho de 2024

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à própria sorte

Sem terras, indígenas sobrevivem às margens de rodovia em Mato Grosso do Sul

Foto: Valter Campanato/ABr

Dentro de barracões de lona à beira de rodovia, índios da comunidade do Kurussu Ambá chegam a dormir no chão pela falta de espaço e de colchões

Dentro de barracões de lona à beira de rodovia, índios da comunidade do Kurussu Ambá chegam a dormir no chão pela falta de espaço e de colchões

Às margens da Rodovia MS-284, que liga a cidade de Amambai a Coronel Sapucaia, próximo da fronteira com o Paraguai, dezenas de barracas de lona servem como abrigo para 76 famílias de índios da etnia Guarani Kaiowá.


Eles esperam o reconhecimento do direito de posse das terras tradicionais, hoje ocupadas por mais de dez fazendas nos limites entre os dois municípios vizinhos. Formam a comunidade ou aldeia do Kurussu Ambá.

A recepção a quem chega tem a desconfiança de quem já deparou com visitas pouco amistosas e se acostumou a viver sob ameaça desde 2007. Pelo menos três líderes indígenas foram mortos após tentativas de ocupação de parte das terras reivindicadas. Uma das vítimas foi Ortiz Lopes, executado a tiros por um homem desconhecido na porta de casa, em 8 de julho de 2007. Os índios dizem que os crimes foram cometidos por jagunços a mando de fazendeiros.

Após detalhada identificação, os homens – que costumam se aproximar de visitantes desconhecidos munidos de porretes para, se necessário, se defender – se dispõem a falar sobre o drama em que se encontram. Querem se pintar para a ocasião e providenciam até uma espécie de “brincadeira de adultos”, que funciona como dança de boas-vindas. A alegria some, entretanto, ao lembrarem que a luta pela terra segue sem previsão de fim.

Os estudos de demarcação que antecedem a homologação da área ainda não foram concluídos. Fica a persistência, como relata Cilene Fernandes, 28 anos, indicada para ser a porta-voz do grupo na entrevista.

“A gente vai caminhando em frente, mesmo que aconteça alguma coisa a mais. A gente não vai desistir da nossa terra. Não podemos deixar isso para os fazendeiros. Se não entrarmos lá, eles vão destruir todas as florestas. Antes que façam isso, temos que retomar o que é nosso”, afirmou Cilene. “A gente se protege. Qualquer ameaça, todo mundo se junta e assim nós vivemos aqui dentro”, acrescentou.

No barracões precários, as famílias se espremem. Até mães com crianças de colo dormem no chão. Para se alimentar, dependem da distribuição de cestas básicas pelos governos federal ou estadual, sujeita a atrasos. Em troca de algum mantimento, os homens prestam pequenos serviços na Aldeia Taquaperi, vizinha à área das barracas improvisadas.

As crianças não estudam e são as mais prejudicadas pela frágil alimentação. Desde 2007, duas morreram de desnutrição na comunidade. “As crianças passam muita dificuldade, elas estão desnutridas, precisam de alimentação e a gente não tem de onde tirar, não consegue plantar nada”, disse Cilene.

Bem perto dali, o contraste social da região se evidencia. Do outro lado da rodovia, há uma grande plantação de soja, já colhida. Índios contam que ficaram gripados quando o vento jogou sobre eles parte do veneno usado na plantação. Alguns quilômetros acima, é possível ver as boiadas em imensos pastos.

Na despedida, os índios sem terra pedem para não serem esquecidos pelas autoridades. “Nossa situação tem quer se resolvida. A gente se envergonha de ficar nessa beira de estrada. Só estamos esperando a demarcação para voltar a nossa terra e plantar alguma coisa para as crianças”, afirmou Cilene.

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