Um especialista em políticas pública do Chile, país que recentemente teve que lidar com as consequências de uma catástrofe natural que deixou milhares de pessoas desabrigadas, fez um alerta para o perigo de violência que poderá ser gerada após os deslizamentos no Estado do Rio de Janeiro, atingidos por tempestades e inundações.
Para o professor chileno de políticas públicas Andrés Chacón, secretário do Instituto Chileno de Estudos Municipais, da Universidade Autônoma do Chile, "as autoridades devem estar atentas a como lidar com os desabrigados ou que perderam familiares".
Em entrevista à BBC Brasil, ele disse que se não houver "atenção" das autoridades com os sobreviventes do desastre e "planejamento" para o deslocamento destas pessoas, "haverá violência".
"É um círculo vicioso", disse Chacón. "As pessoas têm perdas pessoais e materiais, estão estressadas por tudo isso, o que já é motivo para provocar tensão. E são levadas para outros locais sem infra-estrutura adequada, pouco habitados, sem iluminação necessária e o medo e essa falta de planejamento geram violência. Sem planejamento, há violência", afirmou.
Ele recordou que no Chile a "desorientação" provocada pelo terremoto, que foi seguido por tsunamis, contribuiu para a série de saques a supermercados e lojas de departamentos nas cidades arrasadas, como Concepción, apesar de o país ser apontado, normalmente, como seguro e não estar acostumado a este nível de violência.
''Falha nas políticas públicas''
No Chile, após os tremores e tsunamis do dia 27 de fevereiro, as pessoas conviviam com boatos frequentes sobre novos saques ou novos desastres, intensificando o caos nas regiões.
"As políticas públicas são fundamentais para evitar os estragos provocados pelos desastres naturais e também para impedir o caos que surge depois", destacou. Segundo ele, no caso do Chile, o terremoto "não foi só um problema da natureza".
Para o professor chileno, especializado também em psicologia e educação, a falta de políticas governamentais para evitar desastres e para a ação coordenada após as catástrofes ampliaram o problema, que já era grave.
"No caso do Chile, os municípios dependem dos recursos do governo nacional, que centraliza as políticas públicas, e elas não funcionaram ou funcionaram lentamente, piorando o quadro dos afetados pela catástrofe", disse.
Nas regiões chilenas de Maule e Biobío, as mais destruídas pelos tsunamis, moradores passaram dias sem água e sem luz. Muitos ainda hoje, 40 dias após a tragédia, moram em abrigos improvisados ou barracas de acampamento. Para o especialista, as políticas públicas, tanto no Chile quanto no Rio, "falharam", começando por permitir a construção de moradias em áreas de risco.
"No Rio, são as casas nos morros e aqui no Chile casas que voltaram a ser construídas em áreas que já tinham sido destruídas pelos tsunamis, em desastres anteriores. Mas a pessoa é a dona do terreno, não quer abrir mão dele, ou não tem outra opção de moradia, não tem para onde ir. E esse é outro problema que as autoridades devem resolver", destacou.
Para Chacón, a reconstrução pode ser "decisiva" para retirar os sobreviventes do "círculo da pobreza".
"Tanto aqui no Chile quanto no Rio, se a reconstrução não for bem feita poderemos ter mais problemas do que antes. Problemas de meio ambiente, de infraestrutura, que devem ser evitados. Eles podem ser focos de delinquência e de desemprego".
Para ele, as políticas públicas podem impedir novos desastres, no caso do Rio, e servir para que os novos endereços dos sobreviventes "não sejam piores do que antes".