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Sábado, 04 de maio de 2024

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'Cartas Marcadas'

Escândalo das cartas de crédito deixa Estado em alerta; entenda

Foto: Marcos Vergueiro/Secom-MT

Governo pode ter de sacar R$ 2,5 bilhões dos cofres públicos

Governo pode ter de sacar R$ 2,5 bilhões dos cofres públicos

O último mês de 2011 foi marcado por estremecimentos no governo do Estado. O motivo são as controvérsias envolvendo a emissão de cartas de crédito por parte do governo, que vieram à tona após a deflagração da operação ‘Cartas Marcadas’, que também trouxe de volta aos holofotes o já polêmico deputado Gilmar Fabris (PSD). Envolvendo números e processos judiciais, os fatos são complexos, mas a história é emblemática e pode levar o governo a sacar R$ 2,5 bilhões dos cofres públicos. Entenda o porquê e confira os últimos desdobramentos do caso nesta retrospectiva.


A operação

A operação Cartas Marcadas foi deflagrada no dia 5 de dezembro pela Delegacia Fazendária (Defaz) da Polícia Civil e cumpriu seis mandados de prisão e de busca e apreensão. O objetivo era desmantelar um suposto esquema que se utilizava das secretarias estaduais de Fazenda (Sefaz) e de Administração (SAD ), além da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), para realizar o cálculo e a emissão fraudulenta de certidões de crédito, papéis com valores nominais que o governo geralmente emite para o pagamento de dívidas com servidores e que, depois, podem ser negociados legalmente no mercado (são principalmente comprados por empresas com dívidas tributárias que desejam regularizar-se perante o Estado).

A polícia apontou a existência de um rombo nos cofres públicos devido à emissão irregular desses papéis. O esquema, segundo a Defaz, teria conseguido fazer com que R$ 636 milhões fossem emitidos, quando, com base em cálculos da Auditoria-Geral do Estado (AGE), a polícia apontou que o valor que deveria ser emitido era de pouco mais de R$ 380 milhões. O prejuízo para os cofres públicos seria, portanto, de pelo menos R$ 253 milhões.

O que levou à emissão desses papéis foi uma dívida que o governo tinha de pagar aos agentes de administração fazendária (AAF). Desde 1996, a categoria, vinculada à Sefaz, busca igualar seus rendimentos com os dos fiscais de tributos estaduais (FTE), ligados à mesma secretaria. A luta da categoria, encabeçada pelo sindicato dos AAF, foi também encampada pelo deputado Fabris.

O sindicato da categoria entrou na Justiça contra o Estado a fim de buscar a isonomia com os FTE. Das instâncias em Mato Grosso, o processo chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Como já havia sentenças a favor dos servidores e as instâncias de recurso haviam acabado, o governo corria, então, o risco de, além de conferir a isonomia aos AAF, ter de pagar-lhes uma indenização pelo tempo que se passou sem que os servidores recebessem os créditos que pleiteavam, os mesmos rendimentos pagos aos FTE (além de salário, verba de indenização, verba por produtividade e outros benefícios).

Acordo

Na conta do sindicato dos servidores, o governo já lhes devia, em 2000, pouco mais de R$ 54 milhões. Em 2008, o valor corrigido e atualizado já ultrapassava R$ 1,29 bilhão. Na iminência de perder a causa na Justiça, o Estado previa um desgaste financeiro considerável. Foi quando o deputado Fabris entrou em ação e “costurou” com o governo um acordo com os AAF.

Os servidores ainda queriam a isonomia, mas, após mais de dez anos de briga judicial, abriam mão de aproximadamente 65% do valor da indenização, que acabou ficando por volta de R$ 472 milhões.

O governo aceitou o acordo e a Assembléia Legislativa (AL) aprovou uma lei que assegurava o pagamento da indenização aos AAF e, cujo artigo quarto, concedia-lhes os mesmos benefícios e reajustes dos FTE e dos agentes de tributos estaduais (ATE), que compõem o Grupo TAF. Logo o governo iniciaria a emissão de sete cartas de crédito para indenizar cada um dos servidores no valor que eles concordaram no acordo. A Sefaz calculou os valores para cada servidor, a SAD emitiu os papéis e a PGE deu início aos processos de compensação.

Porém, o Ministério Público (MP) contestou a constitucionalidade do quarto artigo da lei. Dentre as razões, consta o fato de que não caberia a servidores de setor administrativo, no caso os AAF, receber verba por produtividade. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) determinou que o Estado retificasse o artigo, que continua com o mesmo texto original hoje.

Em maio, o governador Silval Barbosa solicitou à AGE um estudo sobre as compensações de crédito então em curso. Entretanto, queixas recebidas pela Defaz referentes às certidões emitidas para os AAF restringiram o foco da auditoria para esta categoria. As mesmas queixas, apresentadas por servidores que se disseram lesados por não terem recebido todas as cartas de crédito que lhes cabiam.

A AGE enviou ao governador um parecer inicial sobre os cálculos das indenizações, sobre os valores das cartas emitidas com base nas planilhas dos rendimentos dos servidores e sobre os processos de compensação. Àquela altura, a AGE concluíra que o montante emitido em cartas de crédito era superior ao valor devido, que seria de R$ 142 milhões segundo sua interpretação da sentença judicial que determinava o pagamento e considerando a anuência dos servidores no acordo de 2008.

O governador, então, decidiu mandar suspender todas as compensações de títulos referentes ao acordo.

Escândalo

Com base nas queixas recebidas e nos cálculos da AGE, que apontavam falha ou fraude nos números que basearam a emissão das cartas de crédito, a Polícia investigou o que seria um caso envolvendo crimes contra a administração pública, estelionato, fraude processual, peculato, corrupção e formação de quadrilha.

A Defaz pediu na Justiça autorização para realizar escutas telefônicas e, depois, solicitou mandados de prisão temporária (de cinco dias) e de busca e apreensão. A operação ‘Cartas Marcadas’, desencadeada no início do mês, consistiu no cumprimento desses mandados.

Foram presos o ex-presidente do sindicato dos AAF, João Vicente Picorelli; o economista contratado pelo sindicato para rever os cálculos das indenização, Antônio Pereira Leite; Enildo Silva Martins, servidor da Sefaz; o advogado Enelson Alessandro Nonato; o advogado Ocimar Carneiro de Campos, concunhado de Fabris; e João Constantino, funcionário de Ocimar.

A polícia cumpriu mandados de busca e apreensão em diversos locais, inclusive na casa de Fabris e na casa de sua sogra dele, em Ribeirão Preto-SP. Houve rumores de que Fabris, antes licenciado da AL, conseguira informações privilegiadas a respeito da ação da polícia e antecipou seu retorno ao Legislativo a fim de escapar de um eventual mandado de prisão por gozar de imunidade parlamentar. A defesa do deputado negou que tenha ocorrido qualquer manobra.

Decorridos alguns dias após a operação e sua divulgação pela própria polícia, houve um estremecimento no governo estadual devido aos rumores de que figuras do alto escalão estariam envolvidas no escândalo das cartas de crédito. Foram citados os ex-titulares da Administração e da Fazenda, Geraldo de Vitto e Eder Moraes, além de ter sido cogitada a possibilidade de o ex-governador Blairo Maggi depor à polícia.

A Justiça acabou decretando sigilo ao inquérito da Defaz – que ainda não foi concluído – e Fabris passou a se defender no caso alegando não ter participado dos cálculos das indenizações e atacando pessoalmente o titular da AGE, José Alves Pereira, que foi chamado de “trapalhão”.

Desdobramentos

A AGE reafirmou os cálculos fornecidos à Defaz e o governo manteve a suspensão de todos os atos referentes às cartas de crédito. A polícia continua com a investigação do caso e ainda não divulgou indiciamentos.

Segundo o próprio governo, cerca de R$ 271 milhões em cartas de crédito chegaram a entrar em processo de compensação.

O Estado ainda precisa averiguar se algum processo foi concluído, mas corre o risco de sofrer prejuízo ainda maior: 21 agentes fazendários ainda buscam na Justiça o pagamento integral – segundo o cálculo do sindicato – de suas indenizações.

Desses 21, 10 são servidores que, em 2008, deram prosseguimento ao processo contra o Estado por não concordarem com os termos do acordo articulado com o auxílio de Fabris. Os demais 11 entraram com ação de execução contra o Estado em outubro pleiteando receber os créditos que, mesmo com o acordo, o governo não pagou.

Os valores corrigidos para estes 11 servidores são superiores a R$ 67,6 milhões, mas caso a Justiça dê parecer favorável à ação deles, os demais servidores terão condições de pedir o mesmo. O valor de R$ 1,29 bilhão calculado em 2008 seria superior a R$ 2,5 bilhões hoje, com juros e correções.
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