Olhar Jurídico

Quarta-feira, 17 de julho de 2024

Notícias | Geral

Conheça parte da história do Judiciário de MT pelos olhos dos aposentados

Em comemoração ao Dia Nacional do Aposentado, celebrado neste domingo (24 de janeiro), a Coordenadoria de Comunicação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) reuniu alguns dos melhores casos vivenciados por magistrados aposentados ao longo dos seus anos de atuação. Pois, cada acontecimento, em cada vara, conta um pouco da história do Judiciário mato-grossense.


Fundador da Comarca de Rondonópolis (212 km ao sul de Cuiabá), em 1959, e da Escola Superior da Magistratura de Mato Grosso (Esmagis-MT), em 1985, o desembargador aposentado João Antônio Neto tem muita história para contar. Aos 96 anos de idade, o magistrado tem 13 livros publicados e nem pensa em parar. “Estudar, escrever e ler me ajudam a seguir em frente, pois essas atividades me dão vida. Da magistratura, só tenho boas recordações”, conta.

As principais lembranças dele são da Comarca de Rondonópolis. “Rondonópolis sempre foi uma jurisdição muito complexa, pois a cidade recebia um fluxo enorme de pessoas que migravam para lá de todo o país, levando naturalmente os problemas e vantagens da sua origem. Por isso, o magistrado tinha que ter uma visão múltipla dos problemas e estar mais bem preparado que o comum”, relembra.

Para ele, os juízes em exercício não podem renunciar a experiência dos juízes que já exerceram sua função. “As causas ainda são as mesmas desde 1930. Renovada pelas necessidades do progresso, mas as bases da legislação são as mesmas. Se pudesse dar um recado aos novos juízes, diria para eles: se reúnam sempre e troquem ideias”, diz.

Quem também tem ótimas lembranças das comarcas pelas quais passou é o juiz aposentado Manoel Ribeiro Filho. “Eu tenho um carinho muito especial por Guiratinga (328 km ao sul de Cuiabá), pois lá comecei duas carreiras. Inicialmente, fui para a cidade porque tinha passado em um concurso do Banco do Brasil. Passados 11 anos, retornei para lá, mas desta vez como juiz da comarca. Para mim, foi um orgulho e uma satisfação, principalmente porque Guiratinga é a terra da minha esposa. E foi lá que a conheci e me casei”, narra.

O magistrado lembra com humor que o sogro brincava com ele à época, que depois que o genro se tornara juiz da comarca, passou a ser mais cumprimentado quando passeava pela rua. “Ele dizia: ‘agora todos tiram o chapéu pra mim’. Fiquei pouco tempo lá, em seguida fui para Diamantino e em apenas 22 meses fui promovido para a Capital. Entrei na magistratura logo após a divisão do Estado, muitos juízes optaram por ficar em Mato Grosso do Sul e assim as comarcas ficaram esvaziadas. Por isso minha carreira foi muito rápida”, lembra.

Na Comarca de Diamantino, Manoel conta que era responsável por jurisdicionar em nove municípios diferentes. Para fazer uma intimação de uma testemunha de outra cidade, por exemplo, ele tinha que recorrer à Polícia Civil. “A parte vinha de sua localidade tão distante para contribuir com a justiça e muitas vezes não tinha dinheiro para se alimentar nem para retornar para casa. Aí nós tínhamos que fazer uma vaquinha para ajudar. Veja a dificuldade. Mas havia um respeito muito grande com o Judiciário. E por isso trabalhávamos com muita dedicação. Os advogados também eram muito cordiais. Eles levavam revistas e jornais atuais de cortesia, pois sabiam que lá não chegavam semanários”.

Admirador dos métodos de pacificação social como a conciliação e a mediação, o juiz quer continuar contribuindo com a Justiça. “Estou matriculado em um curso de Novas Técnicas de Mediação e Conciliação judiciais, na Escola do Servidor. Quero me aprofundar nesse conhecimento, porque pretendo exercer esses métodos e facilitar a conciliação entre as partes. Quero voltar a fazer o que eu já procurava fazer como magistrado. Estou entusiasmado com essa possibilidade”, destaca.

Já o desembargador aposentado José Silvério Gomes, perguntado sobre a carreira na magistratura, garantiu ser feliz com suas conquistas e que faria tudo de novo se possível fosse. “A gente sabe que a carreira da gente tem um começo, um meio e um fim, e temos que nos preparar para isso. Eu sabia que minha vida seria de clausura e trabalho, e que eu não teria uma rotina comum. A minha vida foi de casa para o fórum e vice-versa. Mas a magistratura é a minha vocação e faria tudo de novo. Por enquanto, estou curtindo os netos. Além disso, tenho um escritório montado e vou para lá todos os dias. Também continuo lendo e estudando, pois não tem como parar, é um vício”, diz.

Entre os principais legados do desembargador, está a criação da TV.JUS do Tribunal de Justiça. “A TV.JUS nasceu na minha gestão. A ideia foi da jornalista Araísa Ferreira e eu a acolhi, pois sempre acreditei que a Justiça deveria ser transparente e estar próxima da população. Tivemos várias reuniões de alinhamento com o Conselho Nacional de Justiça, em Brasília, até que no final da gestão ela foi instalada”, recorda-se.

Não faltaram causos e acontecimentos inusitados na vida do magistrado. Ele relembra que periodicamente quando precisava ir de Tangará da Serra (239km a médio-norte da Capital), comarca que jurisdicionava, até Barra do Bugres (168km a médio-norte), passava alguns apertos. “Nós tínhamos que ter o carro puxado por um trator para subir a serra toda vez que fazíamos aquele caminho. O desembargador Paulo da Cunha , que era promotor de justiça lá na época, também fazia esse trajeto. Era uma dificuldade tremenda, mas independente de ter estrada ou não, a gente ia e fazia o trabalho com gosto”.

Outra história lembrada por ele se passou quando foi juiz eleitoral em Barra do Bugres. “Certo dia os índios de uma tribo local foram para a porta do Fórum exigir que lhes déssemos títulos de eleitor para votar. Eles repetiam com cara de poucos amigos: ‘Índio quer fazer título!’. Fiquei sem saber o que fazer. Para resolver a situação, com ajuda do meu assessor, vimos quais eram alfabetizados e demos os títulos a eles. A propósito, eu só tive sucesso na minha carreira graças aos servidores que trabalharam comigo. Sem eles não teria sucesso nenhum, pois eles me ajudaram muito”.

Depois de 53 anos de trabalhos prestados à sociedade, o desembargador Leônidas Duarte Monteiro também se aposentou. “No começo foi muito difícil. É muito tempo trabalhando com uma coisa e ter que parar me deixou um pouco triste, mas depois segui o ensinamento da frase de William Shakespeare, que diz: ‘A transformação é uma porta que se abre por dentro’. E passei a mudar minha rotina e a fazer coisas que antes nunca tinha tempo, como fazer a sesta, ir ao supermercado, levar meu carro ao mecânico e, o que eu mais gosto de fazer, que é ler. Hoje posso dizer que nunca fui tão feliz. Embora fizesse o que gostava, sempre fui excessivamente preocupado. Hoje sou um homem mais leve”, assume.

Em sua primeira sessão de júri, enquanto ainda era promotor, em 1966, Leônidas narra que teve uma ingrata surpresa. “Lembro-me de sair de Cuiabá à noite e chegar de madrugada em Diamantino, pois na semana seguinte começariam as sessões do júri. Fiquei instalado na pensão do ‘Seo Chiquinho’, pai do hoje ministro Gilmar Mendes. E, na primeira audiência, para a minha surpresa, reconheci de cara o réu. Era um colega de turma que sentava logo atrás de mim na juventude. Foi um choque ter que acusá-lo, pois eu sabia que era um homem de boa índole. Mas não havia como absolvê-lo, pois ele tinha cometido um crime”, recorda-se.

Aos aposentados, o magistrado deixa uma mensagem: “A gente tem que gostar de ser feliz. Observo que tem algumas pessoas que tem certo pudor com a felicidade. Todos quando nos aposentamos temos um pouco de débito com os familiares em razão da dedicação de tempo que o trabalho exige. E é neste momento, na aposentadoria, que podemos aproveitar melhor a companhia da nossa esposa, dos nossos filhos e netos. Portanto, aproveitem esse momento que é único e muito feliz!”.
Entre em nossa comunidade do WhatsApp e receba notícias em tempo real, clique aqui

Assine nossa conta no YouTube, clique aqui
Sitevip Internet