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'Confissão Premiada': resolução do CNMP permite acordo para criminosos não irem à Justiça

27 Mai 2018 - 11:01

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Olhar Direto

Mauro Curvo

Mauro Curvo

"Acordo de não-persecução penal". "Confissão premiada". Parece confusa, mas a idéia é simples: permitir que o Ministério Público feche acordo com criminosos para que confessem e cumpram penas reduzidas, imediatamente, sem abertura de processo.


O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) permite desde 30 de janeiro deste ano que o Ministério Público Estadual (MPE) realize o procedimento.

O acordo está previsto no Artigo 18 da Resolução 181/2017 e já foi publicada no Diário Eletrônico do Conselho. Contudo, há restrições: a garantia só será aplicada aos crimes cujas consequências financeiras não sejam vultuosas e que preveem penas inferiores à quatro anos de prisão.

A Resolução se espelha na experiência americana de justiça e deve ser encarada como avanço, avalia o procurador-geral de Justiça Mauro Curvo. Ao Olhar Jurídico, o chefe do MPE vê, nos acordos, o combate "superlotação" dos Tribunais.

À despeito dos louvores ministeriais, a mudança não foi recebida à unanimidade: atribuir ao Ministério Público poder para realizar acordos com criminosos confessos usurparia poderes atrubuídos aos juízes e desembargadores? O MP tem autoridade para isso? Quais as conseqüências, à longo prazo, da implantação da 'cultura dos acordos'.

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Conforme o Artigo 18 da Resolução 181/2017, o Ministério Público pode propor acordo de não-persecução penal (ou seja, para não processar alguém) nos casos em que a pena mínima for inferior a quatro anos e nos crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa.

“Não sendo o caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor ao investigado acordo de não-persecução penal, quando, cominada pena mínima inferior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, o investigado tiver confessado formal e circunstanciadamente a sua prática”, consta do referido artigo.

Conforme o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), os acordos de não-persecução penal serão submetidos a controle prévio da Justiça e o investigado deverá seguir condições para a celebração desses acordos, por exemplo: reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo impossibilidade de fazê-lo; renunciar voluntariamente a bens e direitos, indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; e prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo Ministério Público.

Para o procurador-geral de justiça Mauro Curvo, a mudança é “um dos caminhos fundamentais a serem trilhados se quisermos um dia obter maior eficiência na área da persecução penal”. O chefe do MPE exemplifica. “Na experiência americana, veremos inúmeros juristas dizendo que a Justiça nos EUA tem o mínimo de eficiência, que é devido a um fato principal: nem tudo vira processo. Pois, se eles fizessem o que fazemos no Brasil - transformar tudo em processo - teriam entrado em colapso”.

Para Curvo, o principio que obriga o MP a ofertar denúncia quando diante de um fato tipificado como crime “abarrota o judiciário, faz com que eles tenham que se debruçar sobre o caso, onde já há um réu confesso. Isso poderia ser resolvido de outra maneira, que não fosse um processo. Deveríamos aproveitar as atuais ‘audiências de custódia’ para transformá-las em ‘audiências de acordo de não persecução’, onde a pessoa saísse de lá já com a pena homologada judicialmente e fosse para cumprimento imediato. Seriam penas ‘não restritivas de liberdade’”.

O chefe do MP aborda um exemplo: “Imagine uma pessoa que comete um roubo e é presa em flagrante. Ela é presa com a arma do crime, com o objeto roubado, é reconhecido pela vítima, que aponta: ‘foi este quem roubou’. Ora, levemos a situação para a audiência e lá mesmo já fica dito: ‘olha, a pena para roubo é de tantos anos, vou logo lhe propor uma pena de tantos anos e você já sai daqui preso’. Indago ao internauta: o que pode acontecer no curso desta ação penal que vai tirá-lo do destino de ser condenado? Nada. Não tem o que aconteça, se o cidadão for preso com a arma e o produto do crime, sendo reconhecida pela vítima e presa por populares. O cumprimento de pena seria normal, somente o devido processo penal é que seria feito na hora, naquele momento”.

Caso o sujeito não se declare culpado, Curvo propõe. “Começa uma negociação entre MPE e a defesa. É chegar e dizer: ‘aqui, companheiro, você está dizendo que não é você, é um direito seu, mas é você, sim. Você foi filmado e é o seguinte: melhor entrarmos em um acordo aqui do que isso virar um processo, pois se vira um processo, a pena será aplicada com muito mais rigor’. Porque as penas oriundas de processo são mais rigorosas? Para estimular os acordos. Se a pena é de 06 a 12 anos de cadeia, no fim de um processo a pena será de uns 10 anos. Perguntar: ‘então porque o senhor não faz logo um acordo aqui para pegar uma pena de 07 anos e já começa a cumprir logo sua pena?’. Se defesa e réu concordam, aquilo é mandado para o juízo e o acordo é homologado”.
 
A mudança ainda não foi posta em prática em Mato Grosso e o recebimento da Resolução foi unânime. Curvo lamenta: "Para variar, esse projeto já está sofrendo questionamentos. Por exemplo, estão querendo esse projeto para situações que não envolvem prisão, mas não tem jeito. Só vamos ter maior eficiência naqueles casos que trazem maior prejuízo à sociedade ou à pessoa quando aplicarmos solução rápida para os casos mais simples, de modo que não congestione o tramite de processos”, finaliza Curvo.
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