Olhar Jurídico

Domingo, 28 de abril de 2024

Notícias | Criminal

120 usuários de drogas vão à audiência coletiva

As mãos estão trêmulas. A voz embargada, os lábios têm dificuldade para articular as palavras. O olhar está perdido e a postura é de inquietação. Este é o comportamento do desempregado J.J.D.M., 26 anos, usuário de álcool e drogas ao passar pelo Núcleo Psicossocial do Juizado Especial Criminal de Cuiabá (Jecrim). Em crise de abstinência, ele mal consegue contar sua história para a assistente social que o atende.

Ele é um dos 150 usuários de drogas que foram intimados a comparecer na audiência coletiva realizada nesta terça-feira (14 de abril) no Jecrim. Deste total, 120 estiveram no local. Assim que chegaram foram conduzidos para o auditório onde assistiram vídeo educativo e palestra, proferida por um psiquiatra, mostrando a nocividade e os problemas causados pelas drogas, tanto lícitas, quanto ilícitas.

Logo após, todos foram encaminhados para o Núcleo Psicossocial, onde é realizada a triagem, por psicólogos e assistentes sociais. A partir desta triagem, cada dependente químico é conduzido para um grupo terapêutico para fazer acompanhamento ou para os Centros de Apoio Psicossocial (Caps) para tratamento.

Dependente de álcool e maconha desde os 15 anos, J.J. trabalhava como garçom, mas em razão da dependência química não consegue mais emprego. “Tive a cabeça fraca e acabei entrando para este mundo. Meu problema maior é com o álcool. Bebo todos os dias, qualquer coisa que tenha álcool. Mas quero mudar, preciso sair dessa vida, mas sozinho não consigo, preciso de ajuda”.

J.J. foi encaminhado para tratamento no Centro de Apoio Psicossocial – Álcool Drogas (Caps AD). “Ele necessita de um tratamento de desintoxicação. Precisa se afastar do meio, precisa de atendimento médico, pois ele está em crise de abstinência”, explica a assistente social do Jecrim, Gilda Rodrigues.

Além desta rede de apoio voltada para os usuários, a Justiça Terapêutica tem um trabalho direcionado aos familiares dos dependentes químicos, por meio do grupo de apoio “Amor Exigente”. Eles se reúnem na sede do Jecrim todas as quartas-feiras, das 15h às 17h. Neste período um grupo de voluntários qualificados pela equipe do Amor Exigente faz atendimento aos familiares dos drogaditos.

No grupo eles aprendem os 12 princípios básicos para saber lidar com este tipo de problema. Os voluntários auxiliam as famílias, principalmente as mães, que são as que mais participam, a tomarem a iniciativa de mudar, de parar de encontrar o culpado para o problema e partir em busca de uma solução.

“Quando elas entendem a proposta, saem da co-dependência, elevam a autoestima e começam a encarar a dependência do filho de outra forma. Elas deixam a posição de culpa e assumem um papel pró-ativo. O grupo não é para sarar o filho, mas sim a mãe. A maioria chega aqui com a autoestima lá embaixo, pois sofre agressões, ameaças e violência, tanto física, quanto psicológica. Com o tempo vão aprendendo a ter voz ativa, voltam a ter autoridade dentro de casa e dão outro sentido a vida”, explica a coordenadora regional do “Amor Exigente”, Maria Mercedes Ramos.

O juiz Mário Roberto Kono de Oliveira, do Jecrim, explica que a maioria dos usuários que chega até o Jecrim não é a Polícia que traz (por meio das prisões por porte de arma), mas sim as próprias famílias. “Tem ainda as situações em que o dependente vem sozinho em busca de ajuda. Já tivemos casos do usuário dormir na porta do Jecrim esperando amanhecer para alguém ajudá-lo”.

Ele diz que o número de usuários atendidos no Jecrim, por meio da Justiça Terapêutica, é apenas a ponta do iceberg, do que vive hoje a sociedade. “A droga está alastrada em todo meio social, não importa a situação financeira, o sexo ou a idade. A família, que é o sustentáculo, está desestruturada, por isso não adianta tratarmos apenas o usuário, temos que trabalhar com a família dele também”.

Conforme o magistrado, pelo menos 50% dos processos que tramitam atualmente no Jecrim têm as drogas como ponto principal. “Há 15 anos, quando iniciamos este trabalho aqui no Juizado, o número total de processos girava em torno de 800, hoje este número é mensal. Não podemos fazer apenas a Justiça tradicional, temos que ir além”, defende Mario Kono, completando que a próxima audiência coletiva será realizada no dia 21 de maio.
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