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Quarta-feira, 01 de maio de 2024

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ENTREVISTA AO OD

Novo chefe do MP fala sobre combate ao crime organizado, perspectivas, estratégias e projeções futuras da gestão

Foto: Olhar Direto

Novo chefe do MP fala sobre combate ao crime organizado, perspectivas, estratégias e projeções futuras da gestão
Empossado novo procurador-geral de Justiça do Ministério Público Estadual para o biênio 2023/2025, Deosdete Cruz Júnior, de 42 anos, conversou com o Olhar Jurídico nesta semana sobre a chacina de Sinop, que chocou o país, pontos estratégicos da gestão, investimentos, orçamento da instituição, metas futuras e mais. Confira a íntegra da entrevista abaixo.

O novo PGJ foi eleito no dia 5 de dezembro de 2022 com 206 votos, conquistando o primeiro lugar na lista tríplice que foi enviada ao governador Mauro Mendes. Única adversária na disputa, a promotora Elisamara Sigles Portela recebeu 76. Deosdete, então, foi empossado por Mendes no dia 9 de fevereiro de 2023.

Ao assumir o cargo máximo do MPE, ele afirmou que para garantir uma atuação mais proativa e resolutiva da instituição, priorizará métodos autocompositivos. Ele pretende ampliar o Núcleo Estadual de Autocomposição (NEA) visando proporcionar aos seus pares de justiça o suporte adequado para alcançar as metas estabelecidas.

Confira abaixo a íntegra da entrevista que o PGJ concedeu ao Olhar Jurídico
 
Sobre a chacina em Sinop: o MPE tem alguma orientação ou força-tarefa para acusação do responsável? Além disso, a chacina levantou novamente a discussão sobre o armamento da população. Como o MPE avalia a revogação do decreto do armamento? Acredita que tal revogação resultaria na diminuição ou aumento de crimes com arma de fogo?

Esse caso da chacina é um caso chocante, pelo menos das informações preliminares que nós temos, ficamos muito chocados com isso porque você vê pelas imagens a frieza com o qual aquele crime foi praticado. Existem diversos fatores que uma boa investigação vai apurar, e esses fatores podem sim dar causas à questões paralelas como por exemplo a questão do desarmamento. O que existe infelizmente é um elevado nível de violência na sociedade brasileira. E esse elevado nível de violência está sendo exposto seja através de armas legais e armas ilegais. Não me parece que uma política de liberação de armas por si só seja capaz de frear os índices de violência. O povo brasileiro, embora seja muito pacífico em muitos aspectos, ele ainda é muito violento. Então o acesso muito facilitado às armas pode dar ensejo a esse tipo de violência. Então nós temos que analisar isso. O congresso nacional, na minha visão é a instituição que tem a legitimidade popular para fazer essa análise. Não só o poder executivo. Precisamos que aqueles mandatários da população, que receberam votos, discutam isso sem paixão.  Armar a população torna a vida do cidadão mais segura ou mais violenta? Essa é uma conclusão que tem de vir do congresso nacional de uma vez por todas para que a gente não fique ao sabor da mudança dos governos do executivo. Nós precisamos de uma política de segurança pública, e não uma postura de segurança pública que adote a conveniência do presidente da república.

Na semana passada, o deputado federal Emanuel Pinheiro Neto disse ter provas sobre a conivência do ex-PGJ acerca de irregularidades no convênio do BRT em troca de, supostamente, receber o prêmio de desembargador de Mauro Mendes. O que o MPE tem a dizer sobre isso?

Ex-procurador-geral de Justiça é um membro que tem mais de 30 anos de carreira. Um colega dedicado as causas sociais, que assim como qualquer pessoa que desempenhe uma função pública está exposto a um julgamento, da opinião pública inclusive, mas sempre agiu com total isenção e lisura. Até nos pegou de surpresa essa fala do Emanuelzinho porque todos aqui dentro sabemos de ouvir da boca do próprio josé Antônio borges, que ele não tem interesse em disputar a vaga do quinto, inclusive incentivava outros colegas que o fizessem e assim desejassem. Inclusive já vimos por mais de uma vez ele falar para os colegas inclusive membros do MPE que não almejava esse relevante posto do poder judiciário.

Ainda, você e mais alguns membros do MPE viajaram à Brasília na semana passada e visitaram o deputado Emanuel Pinheiro Neto. Qual foi o motivo da visita?

Nossa posse aconteceu na quinta-feira, na sexta foi o primeiro dia de exercício como procurador-geral. Fizemos uma viagem a Brasília, eu como PGJ recentemente investido no cargo, subprocurador-geral de justiça Marcelo Ferra, promotor auxiliar e ex-presidente da associação, Rodrigo Fonseca, que cuida das relações com parlamentares e o atual presidente da associação, promotor de justiça Mauro Curvo. Fizemos visitas institucionais a todos os gabinetes de deputados federais que lá estavam. Visitamos todos, com exceção do deputado Juarez, que infelizmente não conseguimos agenda para conversar com ele. Além das visitas com os deputados, tudo fotografado e compartilhado em nossas redes sociais, visitamos membros do conselho nacional. Foi uma visita de cortesia e para conversar com deputados federais sobre um projeto que é muito importante para o MP brasileiro, que é ante a reforma do código do processo penal. Onde tivemos a oportunidade de discutir com cada um deles a nossa pretensão como membro do MP de se ampliar as possibilidades de fazer acordo no processo penal brasileiro. A visita ao Emanuelzinho foi de cortesia de um PGJ que acabou de assumir seu mandato, mas também a todos os outros deputados federais que nos receberam.
 
Em linhas gerais, o que a população mato-grossense pode esperar da gestão Deosdete Cruz no biênio 2023/2025? Quais serão os principais pontos de atuação do órgão na garantida dos direitos do mato-grossense?

Temos algumas linhas que queremos que marque esse biênio, uma delas é ampliarmos com bastante intensidade o uso da autocomposição. O MPE já dispõe de instrumentos muito eficientes como o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), o Acordo de Não-Persecução Cível, de Não Persecução Penal, leniência, transação penal, suspensão condicional do processo e delação premiada. Queremos que a instituição ajude nesse protagonismo da autocomposição, pois sempre que possível, quando o cidadão participa da construção da decisão, nós entendemos que ela se afigura mais justa. Mais fácil você conseguir o cumprimento espontâneo de uma decisão em virtude de um acordo, do que quando é uma execução forçada. Então vamos trabalhar muito pela autocomposição. Outra marca que queremos deixar na nossa gestão é o apoio a projetos institucionais que colocam o MPE muito mais próximos da sociedade: projetos voltados para a consciência da vacinação, voltados a combater a subnutrição de crianças e adolescentes, combate a violência, ao abuso sexual. Temos vários projetos que vamos apoiar.

A Gestão já traçou estratégias para o combate ao Crime Organizado no Estado?

Não posso deixar de falar também de fortalecimento das instituições de combate ao crime organizado. Nós já estamos em discussão om o governo do estado para ampliarmos a capacidade de atuação do Gaeco, que é uma força-tarefa. Não é apenas o MPE, é uma força-tarefa constituído atualmente pelo MPE, PM e PJC e pretendemos que também faça parte do Gaeco o sistema prisional e socioeducativo na medida que grande parte da atuação do crime organizado hoje está acontecendo no ceio do sistema prisional e socioeducativo.

Como Deosdete avalia a gestão passada? Quais renovações pretende trazer? O que será mantido e o que já tem previsão de ser alterado?

Uma das grandes inovações que a gestão anterior trouxe, da qual tive a felicidade de tomar parte dessa gestão, foi a proximidade permanente com os promotores de justiça do interior. Nosso estado é muito grande, temos 141 municípios, mas não temos sedes em 64 deles. Então temos uma preocupação de manter esse contato, essa presença permanente com os promotores e promotoras de justiça do interior para dar o suporte necessário para que as promotorias lá possam desempenhar sua melhor função. Quando falamos de suporte, não é só o material, mas também o institucional: a conversa com o gestor público local, com os órgãos de representação, para que o MPE encontre cada vez mais uma forma de servir e servir de maneira mais eficiente a sociedade do nosso estado.
 
Quais serão os principais desafios da gestão para fazer mais e gastar menos?

Maior desafio que nos temos é a defasagem no número de membros, que vai aumentar na medida em que novos colegas venham se aposentar. Já temos expectativa de que nos próximos três a quatro anos devemos ter uma baixa com aposentadoria em torno de 10 colegas. Se hoje já temos um déficit de aproximadamente 20 promotores, esse déficit vai aumentar. Nós não temos orçamento na mesma proporção para cobrir esse déficit. Então teremos que fazer mais com menos. De que forma? Usando a tecnologia. Temos discutido já alguma ideia com outras instituições, queremos fazer depois uma mesa técnica para discutirmos de que maneira nós podemos distribuir os custos. o custo que vem dos impostos que o cidadão paga para ao invés de construir num lugar onde eu não tenho uma promotoria hoje, construirmos um prédio público só que ao mesmo tempo sirva de ponto de apoio para o judiciário, para o MPE, defensoria e para todo sistema de justiça e cidadania. não precisamos ter o custo para cada uma das instituições. A gente pode compartilhar. Então, com uma boa gestão e uso de tecnologia, nós vamos conseguir atender e até ampliar a demanda do cidadão com o mesmo orçamento, sem ter a necessidade de ampliá-lo.

Audiência pública em 2022 previu orçamento para o MPE em aproximadamente R$ 733 milhões. Como esse valor será investido pelo órgão?

O orçamento do MPE assim como dos demais poderes é o orçamento do ano de 2021 em 2022 ele foi corrigido. Em 2022 também é corrigido pelo índice inflacionário. Então na verdade como esse orçamento vem sendo atualizado? [é o orçamento do ano anterior, mais o IPCA. Foi isso que aconteceu. Esse é um orçamento bom, porém, em virtude por exemplo da demanda alta por serviços de tecnologia a gente tem notado que os contratos de tecnologia e os profissionais de tecnologia tem custado mais historicamente do que sempre custaram. Isso não só no ministério público, mas para todo mundo. Especialmente depois e durante a pandemia esses serviços foram consumidos como nunca antes. Então é um orçamento adequado que vem sendo corrigido pelo índice inflacionário no decorrer dos últimos anos. Não tenho em mãos o detalhamento, mas muito desse valor que tem aí também ele se deve a encargos. Por exemplo, você tem a questão de como houve uma reforma da previdência estadual, aumentou alíquota patronal. Então isso é recolhido do nosso orçamento que antes era 11% passou a ser 14% para o contribuinte 28% para instituição. Então você pega a folha de gasto com o pessoal, 28% daquilo ali é o encargo que a própria instituição tem que pagar. Mas é um orçamento adequado, entendemos que cortando de um lugar, ampliando para outro a gente consegue dar conta da necessidade.
 
Sobre o time da gestão: qual o viés e quais valores elencados por você para atuação da nova equipe de promotores?

Desde o momento que participamos da campanha, trouxemos como objetivos quatro pontos principais na nossa campanha, que é o que vai orientar nosso programa de gestão: integração – que pressupõe que estejamos integrados quer no âmbito interno sem divisões de quaisquer natureza até porque a eleição acabou, e quer no plano externo, nós precisamos conversar e muito bem com as outras instituições e poderes. Temos que entender que o poder público é um só: existe uma divisão orgânica, mas nós temos que somar esforços para um mesmo objetivo. Além da integração, trabalharemos com a 2 – inovação, não só tecnológica, mas é discutir de que maneiras diferentes podemos atuar para encontrar melhores resultados. E isso, na verdade, é buscar a eficiência. Vamos sempre buscar fortalecimento da instituição do MPE porque acreditamos que a instituição do MPE ela foi destinatária da boa vontade do constituinte com a constituição de 88 que depositou muita expectativa em relação ao MPE no sentido de que ele pode colaborar para concretização de direitos. Então, de nada valeria termos acesso a creche, à saúde, segurança pública, ao meio ambiente, direito do consumidor, e idoso se você não tiver instituições que podem cobrar na prática a realização disso. E o MPE faz isso diariamente, seja através da atuação extrajudicial mediando a questão com gestores locais, fazendo termos de ajustamento de conduta, ou quando isso não é possível, levando essa demanda oficialmente ao poder judiciário a quem caberá dar a última resposta.

O incremento tecnológico para efetiva atuação dos Ministérios Públicos do país já é uma realidade. Como será a implementação de tecnologia pela gestão?
 
Temos realizado algumas reuniões com nossas equipes de tecnologia e temos instituído um laboratório de inovação. Nós não podemos desprezar a relevância da inteligência artificial. A IA vai promover mudanças significativas no mercado de trabalho? Vai! Mas é com ela que nós vamos conseguir alcançar níveis de eficiência em grande escala. Porque hoje com a tecnologia avançada como está, nós com um esforço menor conseguiremos produzir resultados maiores, inclusive com detecção com indícios de fraudes. Empresas que muitas vezes estão atuando e há indício de atuação fraudulenta em processo licitatório, com um simples compartilhamento dessas informações nós conseguimos alertar o promotor de outra região para que ele cobre, em tempo, posturas para evitar uma fraude maior. Ou seja, nós temos que combater a corrupção, mas sempre que possível atuarmos de maneira preventiva, e é aí que a tecnologia vai nos ajudar muito. Tem várias maneiras, nós podemos observar das práticas de outros estados e trazermos isso pra cá, como mais recentemente recebemos uma visita do MPE do Maranhão que veio conhecer nossos sistemas. Então o MPMT investe já em tecnologia, mas a sempre muito a fazer especialmente num segmento que não para de sofrer informações.

Como será a atuação do MPE em relação às questões indígenas em Mato Grosso? No final de janeiro, o MPF instaurou inquéritos e Procedimentos administrativos para investigar crimes ambientais, fraudes previdenciárias, e possível omissão do Estado em cumprir obrigações referentes a demandas educacionais indígenas. A gestão Deosdete Cruz já tem alguma estratégia traçada para atuar junto aos povos originários de Mato Grosso?

Nessa questão indígena há uma certa limitação da atividade. não que haja um impedimento do MPE para atuar. É claro que todas as vezes que tiver uma violação de direitos humanos na questão indígena, toda e qualquer instituição deve atuar. Mas há uma atuação preponderante do MPF em relação a isso, de modo que o Estadual, assim como a justiça estadual atuam de maneira residual. Os nossos 258 promotores de justiça devem ficar atentos nas suas respectivas áreas territoriais, portanto em suas promotorias, a qualquer demanda que surgir relacionadas aos povos indígenas, não sendo da nossa atribuição, encaminharemos com a maior brevidade possível ao conhecimento do MPF. Então é um ponto sim na nossa tensão, mas nos temos que fazer esse parênteses: nem tudo que chega numa promotoria de justiça será da nossa atribuição. Mas ai nos imediatamente encaminharemos em quem for de direito.

Em 2022, o MPT, por meio de operações conduzidas pelos grupos móveis de fiscalização, resgatou 33 trabalhadores em condições análogas à escravidão. Como o você prevê a atuação do MPE para o combate ao trabalho escravo em MT?

Nós atuamos em plena sintonia com o MPT, procurador chefe Danilo é um grande parceiro do MPE. Estamos totalmente prontos para apoiá-los nas operações que designarem em nossa esfera de atribuição, inclusive para que o MPT, se necessário, utilize nossa estrutura. Porque como nós estamos presentes em maior número de municípios, poderemos oferecer essa estrutura. E é um absurdo, mas uma realidade triste, que em pleno século XXI, ainda que com novo requinte haja ainda trabalho em condições análogas à escravidão e nós precisamos combater isso com o rigor da lei, inclusive com ações penais que são de atribuição do MPE.
 
Essa será sua primeira gestão enquanto chefe da instituição e, após o biênio, o que você pretende deixar de resultado que realmente faça a diferença para a instituição e ao cidadão?

Legado que nós pretendemos deixar é realmente o aperfeiçoamento da nossa instituição para que ela não se veja apenas como instituição que demanda soluções, mas que promove soluções. Por isso sou um entusiasta da autocomposição. Porque o MPE na sua atuação clássica é um órgão demandante: ele provoca o pode judiciário para resolver problemas e o MPE resolutivo, aquele que queremos deixar como legado, é um MPE que faz mais acordos, que toma parte mais conciliações do que propõe ações. À medida que a legislação nos autoriza com uma diversidade enorme de instrumentos a tomarmos parte da construção do consenso com métodos autocompositivos, esse é um dos grandes objetivos que temos: atuar por uma gestão resolutiva e autocompositiva. Se tivermos atingidos esse objetivo de maneira significativa, sairemos do biênio com a consciência do dever cumprido.

Após o biênio, Deosdete tem pretensão de buscar cargos no judiciário como de desembargador? Pretensões de entrar na política?

Nenhuma pretensão. A instituição onde me realizo profissionalmente como promotor de justiça e estou PGJ é o MPE-MT, temos nomes destacados aqui para concorrerem a função nobre de desembargador, não me coloco entre estes. Admiro colegas que querem participar desse processo, um processo difícil. Mas eu não tenho outro vínculo profissional na minha vida a não ser com o MPE, me realizo aqui e sei que tenho muito ainda a fazer aqui.
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